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terça-feira, 28 de janeiro de 2020

Denunciantes (1j

Manhã de segunda-feira, a arrumar a mala para a escola.
Mãe, a minha bata?
Ainda está molhada, sempre a chover, não enxugou, não a levas.
A professora bate-me!
Bate-te lá agora! Quando entrares, vais-lhe logo dizer que eu não ta mandei porque ainda está ensopada, com este tempo não enxugou.
Bom, que remédio! Pelo caminho, encontro colega, mais velho.
E ele: Tenho de voltar a casa, esqueci-me da bata!
Sempre fui fala-barato. Do género que fala sem pensar: Ora, não precisas, quando a professora te perguntar por ela dás uma desculpa qualquer!
Mas ele voltou atrás. Afinal, estava a meia dúzia de passos de casa.
Entramos. José Cipriano, a tua bata?
Minha senhora..., e repeti a desculpa encomendada pela minha mãe.
A professora, compreensiva, ia passar a outro menino quando o meu vizinho se levanta e fala acusador:
Minha senhora, eu voltei a casa para buscar a minha bata, e ele disse-me que não valia a pena, para dar uma desculpa qualquer à senhora professora quando me perguntasse por ela!
O olhar da jovem professora endureceu, o rosto crispou-se. Levantou-se, furiosa, já com a régua em riste: O quê? Vem já aqui!
A tremer, lavado em lágrimas, tentava inutilmente convencê-la de que tinha dito a verdade. A pesada régua bate impiedosa, dor lancinante, dor sofrida também por antecipação enquanto a próxima reguada não martiriza a minha mãozinha enfezada, que por entre gritos e contorções procura, em vão, fugir ao castigo!
Agora a outra mão, para se não ficar a rir desta!
Quem ria era o feliz denunciante, pelo meu sofrimento, pela sua colaboração no exercício da justiça sobre o sabichão preferido da professora.
Então como agora, a justiça era cega, e exercida com imparcialidade — sobre os pobres. Os meninos abastados, “ricos”, como o meu delator, nunca apanhavam, mesmo se  burros que nem portas! 

terça-feira, 7 de janeiro de 2020

O Tai Chi Chuan e eu

Nos anos noventa treinei versões de Tai Chi Chuan, muito adaptadas, desfiguradas até, pelo mestre Kenji Tokitsu. Paradoxalmente, treinei muito, aprendi pouco, que o mestre, por razões de que suspeito, mas não adianto, fazia, não ensinava, e ralhava à bruta com quem ousava pedir-lhe esclarecimentos: Je suis pas un moniteur!, berrava, furioso. E não corrigia, excepto, talvez, os aduladores que o endeusavam.
Ora aprender apenas pela imitação dos gestos de alguém, de costas para nós, no meio dos outros praticantes, não é muito produtivo, sobretudo quando se trata de algo tão complexo como o Tai Chi. E a brutidade (não confundir com brutalidade) do mestre fez com que me afastasse.
Enveredei por outros caminhos, sempre com muito treino individual. Frequentei seminários do mestre Yang Jewying-Ming, grande especialista em Qi Qong (ou Chi Kung) e Tai Chi Chuan, estilo Yang. Apercebi-me da diferença abismal entre o Tai Chi executado por um chinês com meio século de prática intensa e um japonês com meia dúzia de anos, na melhor das hipóteses, e que o executa de forma demasiado pessoal.
Mas as conversas de curandeiro do mestre Yang, os exemplos e a pseudo-ciência com que fundamentava métodos e tratamentos de herbanários e curandeiros chineses, as suas histórias de mulheres engravidadas em OVNIS, que deliciavam os iógues que também participavam nos seus seminários, ditaram o meu afastamento.
Continuei a incluir nos meus treinos individuais o que de bom, no meu pobre conhecimento e fraco entendimento, tinha aprendido com ambos, como é visível no filme da kata do Goju-Ryu Sanchin, que aqui postei, datada do início deste século: a procura da descontração, a respiração abdominal a conduzir os movimentos, num fluxo ininterrupto como as ondas do mar...
Há uns dois anos, problemas de saúde a que já aqui aludi levaram-me a deixar de participar nos  treinos de karaté de instrutores e avançados, mas não a abandonar os meus treinos individuais, que executo diariamente após uma caminhada, às vezes bicicleta estática.
Incluem aquecimento e Qi Qong, algumas katas (de karaté, passe o pleonasmo) procurando a descontração e a fluidez, depois Tai Chi, estilo Chen, o da minha predilecção. Mas agora tenho a ajuda preciosa de excelentes videos didáticos do YouTube!

Pela clareza da execução e pelo pormenor das explicações, optei pela forma dos 18 movimentos,(na verdade, 18 sequências), destinada a principiantes estrangeiros e legendada em Inglês. E há um vídeo para cada sequência!

Não é fácil de acompanhar, mas a execução e o ensino por esta senhora do Tai Chi, estilo Chen (o mais antigo, de onde derivam os outros estilos), é primorosa. Admire-se, se para tal houver paciência, a elegância, a fluidez, a perfeição de movimentos!
https://www.youtube.com/watch?v=jhzhQ0cVkCQ