O
karaté foi concebido como uma arte de vida. Explico: não tem por fim a vitória
ou a derrota, nem taças ou medalhas, mas a educação dos praticantes, visando,
pelo rigor, pelo esforço e pela disciplina que a sua prática exige, veicular e
ajudar a seguir um rumo na vida orientado pela justiça. Tal
como nas diversas religiões, uma coisa são os ideais propalados, outra a vivência
dos adeptos. Os karatecas não são santos, como os cristãos também o não são.
Os ideais pretendem nortear, encaminhar o homem. O que cada
qual faz com eles é outro problema, aqui e agora irrelevante. Acrescento ainda
que palavras como “arte, vida, justiça, vitória, derrota”, etc., devem ser
vistas como termos com valor iniciático, bem diferente do sentido que
comummente lhes atribuímos; assim, justiça, por exemplo, é indissociável do Ying
e Yang…
Ora
a formação do karateka passa por “moldes”, em japonês kata, termo que designa
um conjunto de práticas ritualizadas, executadas de forma fixa, visando a
perfeição. Nesta perspectiva, religiosa, reconheço, não importa se a kata
executada se reporta à cerimónia do chá ou a práticas de origem guerreira,
normalmente designadas por artes marciais. Pouco importa qual é a kata favorita (tokui-gata), uma vez que não é a kata adoptada que forma o executante,
mas este que, supostamente, evoluirá com a sua prática. Em linguagem popular,
todos os caminhos vão dar a Roma. O que se busca, quase sempre
inconscientemente, são os frutos da perseverança, da tenacidade, da
aprendizagem, colhidos enquanto penosamente
se percorre o caminho (Via em Latim, Do em Japonês) da aprendizagem e da vida.
Executar katas (que, em casos extremos, como o ritsu zen, não têm um único movimento)
não deve ser visto apenas como um combate contra inimigos imaginários, espécie de
shadowboxing, ou mero exercício físico e mental. É mais, perdoe-se-me a
blasfémia, oração e missa. Porque os karatecas executam-nas diariamente com
fervor, convicção – e ausência do sentido do ridículo.
(Neste filme, Teki Shodan. Com alguma dificuldade em levantar as pernas, que o menisco ainda não está a 100%)
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