— Moscego, moscego, vem à cana que tem sebo!
Cana ao alto, o miúdo corre descalço rua abaixo indiferente a topadas, pula a fogueira que esmorece, ardidas as vides, lança para o brasido piparote há anos abandonado na berma, as chamas elevam-se até aos fios do telefone, iluminam fugazmente a rua triste de um país triste, volta a saltar a fogueira, olhos fechados ao atravessar a labareda, a cinquenta anos de distância sinto novamente o cheiro a chamuscado das sobrancelhas e cabelo, a fumarada enegrece-me a face, amanhã na escola gozarão comigo, chamar-me-ão carvoeiro...
Noutras ruas da aldeia haverá outros rapazes a saltar outras fogueiras, luzes que à distância têm a insignificância das estrelas que polvilham o fundo negro do céu, tantas, tão brilhantes, e um dia cada uma delas terá um nome — aquela, que brilha serena, destacando-se de todas as outras, não é estrela, é Júpiter, o maior dos planetas; além, mais abaixo, rente ao horizonte, refulge Sírio, a estrela dupla da constelação do Cão Maior, e acima, no cinturão de Órion, o caçador, há duas nebulosas, M42 e M43. Que melhor tempo, o da infância, em que ignorante me deslumbrava com as maravilhas do Mundo e do Universo, ou este, o do fraco conhecimento, em que pouca coisa me espanta?
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