Desde
a mais tenra infância que os porquês da vida e do Universo me intrigam e
inquietam.
Cresci, mais em anos do que em tamanho, e deixei de irritar os outros com questões que a muito poucos interessam, por demais preocupados com assuntos verdadeiramente importantes, como o campeonato de futebol, a Albuquerque e o negócio dos swaps, o nascimento de um bebé na família real britânica, as viagens do novo papa.
Cresci, mais em anos do que em tamanho, e deixei de irritar os outros com questões que a muito poucos interessam, por demais preocupados com assuntos verdadeiramente importantes, como o campeonato de futebol, a Albuquerque e o negócio dos swaps, o nascimento de um bebé na família real britânica, as viagens do novo papa.
Passei a procurar respostas nos livros,
sem desprezar obras religiosas como A Bíblia; mas nela encontrei sobretudo poesia
primorosa, como o Cântico dos Cânticos, e um repositório de histórias
encantadoras na sua ingenuidade, como o Génesis, a par de outras de fraco
proveito e mau exemplo, como Abraão e o filho, José e os irmãos, o velho pai
que os filhos sodomizam... Nem o Novo Testamento escapa à vulgaridade, com S.
João obcecado em nos convencer de que era o discípulo que Jesus mais amava,
discussões de comadres entre os apóstolos sobre o respectivo lugar no poleiro
celeste, comparações entre o baptismo com o Espírito Santo e o baptismo com
água do Baptista...
Palavreado
sem significado, como muito daquilo que hoje se escreve, que me traz
invariavelmente à boca o velho Porquê? O que é que isso quer dizer? Qual o
significado desse adjectivo, desse substantivo, desse verbo, dessa metáfora,
dessa comparação?
Pois, todos o sabemos, palavras, por bonitas
que sejam, depressa as leva o vento, sem que nos deixem ideias, as quais, raras
e preciosas como as pérolas autênticas, devem ser colhidas com esforço nas
profundezas do mar do pensamento. As quais, quando existem, dispensam o
floreado de palavras, rejeitam a expressão gongórica, recusam os artifícios da
retórica. Ideias que surgem sobretudo na ciência e raramente sobrevivem aos
argumentos destruidores dos pares e à experimentação. E a ciência, tão
compartimentada, tão especializada, com a sua metalinguagem, surge opaca ao
leigo como eu. Só o talento de cientistas-escritores que a Gradiva tem trazido
até nós me tem permitido acompanhar, vagamente, o espantoso
mundo das descobertas.
Há uns anos, insatisfeito com a escassez de
obras de divulgação científica e com a lentidão com que são traduzidas, com a
sua desactualização, inevitável dada a rapidez do progresso científico, passei,
graças à Amazon e ao Kindle, a ler penosamente no original as obras mais
recentes. Tenho encontrado, não a resposta aos grandes porquês, que a ciência
não é o domínio das certezas, mas novas questões, igualmente fascinantes, de
que, por vezes, aqui tenho dado conta, como, por exemplo, reflexões sobre a natureza do Universo,
quais e quantas as suas dimensões, como pôde surgir do nada, a
matéria e a energia negras, o espaço e o tempo... Saber que não terei as respostas não me desanima. Sou capaz de viver
sem certezas. Também eu prefiro a incerteza e a dúvida à certeza da ignorância.
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