Para mim, as conversas ao telefone são um triste remedeio. Ao fim de algum tempo, a mão que o segura fica dormente, aquece a orelha, mudo para a outra, vejo a conversa a arrastar-se, mas não a desenvolver-se, a impaciência provoca-me bicho-carpinteiro, que os numerosos afazeres com que preencho os dias reclamam insistentemente a minha pessoa...
Também nisto me revejo na (minha) avó da Luz. Apesar da solidão, que bem lhe devia pesar durante as longas invernias na aldeia quase deserta, quando me telefonava a conversa era mais ou menos esta: “Vocês estão todos bons? Olha, se cá quiseres vir, já há laranjas apanhadoiras. Beijos para todos, fiquem bem e até à próxima, se Deus quiser." E desligava.
Já a sua filha (e minha mãe) se alongava um pouco mais ao telefone; mas, também ela, logo que tinha sabido dos "meus", me despachava, mesmo quando eu procurava prolongar a conversa:
"Mãe, e por aí?"
"Ora, por cá tudo na mesma, não há novidades. Vou desligar que estou a arrefecer. E estou em pé, doem-me as costas."
Hoje, que tenho a idade de uma e de outra, sinto também que conversar longamente requer ocasião e condições: é preciso disponibilidade, estar presencialmente com os interlocutores, bem instalado, confortável, melhor ainda com comida e bebida à frente — e televisão, computadores e telemóveis desligados.