O S. era um velho implicativo, quezilento, amigo de armar zaragata por ofensas reais ou imaginárias. E passava o tempo a sacanear os outros, por maldade, e para se vangloriar das partidas pregadas.
Ora um dia veio, humildemente, pedir ao dono do café e padaria, malandro como ele, o favor de lhe guardar metade dum cabrito na arca congeladora:
— Bem vês, tive de o matar e só para a mim e para a patroa é carne demais... Se mo puderes guardar umas semanas, até à Páscoa...
E rematou, desconfiado: — Mas não lhe tiras bocado, pois não?
— Por quem me tomas? Achas que preciso da tua carne para alguma coisa?
— Bem, sendo assim, deixo-o à confiança, venho buscá-lo para a Páscoa! E agradeceu muito o favor.
Ele a virar costas e o padeiro a passar palavra: — Logo à noite apareçam e tragam o vinho, que a ceia ofereço-a eu, é cabrito assado no forno!
Bela patuscada, bem regada, acompanhada com pão quente acabado de sair do forno.
Chegou a hora da gabarolice.
— Sabem de quem era este cabrito?
Pois não sabiam. Mas riem já, pressentindo partida pregada a infeliz.
— Do S.
Espanto geral. Como é que tinha conseguido passar a perna a esse sacana, tão desconfiado, tão matreiro?
—Veio-me pedir para guardar na arca meio cabrito esfolado, amanhado, prontinho a assar, só precisei de temperar!
— Mas ele não tem cabritos! Viste a cabeça do animal? Não? Ai o cabrão! Foi mas é o cão que lhe morreu ontem!