Outra noite de calor insuportável. De madrugada, bem antes do nascer do Sol, levanto-me e abro as janelas para refrescar a casa. Depressa a temperatura começa a descer dos 28 graus. Volto a deitar-me, saboreando o fresquinho que entra pelas janelas – para de me levantar de um salto e correr a fechá-las: outro vizinho resolveu queimar o lixo do quintal e a fumarada enche-me já a casa. É assim todo o ano, pouco importando que seja Inverno ou Verão, que haja roupa estendida ou não. Creio que é, simplesmente, espírito incendiário, embora moderado: queimam sempre os resíduos em verde, para não levantarem altas chamas…Com a escolaridade básica, ou professores, ou engenheiros – não importa. É queimar.
Dioxinas? -- Isso é nas cimenteiras.
Mau cheiro? -- Não te chega nada a casa!
Podas, relva, caules de couve, detritos diversos, tudo serve para a fumarada matinal ou vespertina, o que importa é que quando se podem abrir janelas para refrescar as casas lá vem a fumaça. (No Inverno, preferem a hora de maior calor, quando queremos enxugar a humidade da estação. Como podem atender a reclamações, se sempre discordamos da hora das queimadas?)
Como aquele capitão do Apocalypse Now que adorava o cheiro a napalm pela madrugada, assim são eles. Não há melhor perfume matinal, assim até lhes dá gosto levantar cedo, a puta da vida ganha-lhes sentido. É queimar.