Ouço, primeiro no canal 1, depois no 2, o director do jornal "I" dizer e redizer que vulnerabilidade e vulnerável são termos bélicos, logo o presidente, ao mencionar a vulnerabilidades dos sistemas informáticos da presidência, terá pretendido começar uma guerra. Não sei se é por ignorância que o senhor director afirma, como afirmou, que uma pessoa não diz "sinto-me vulnerável" (cito de memória), ou se pensa que nós somos tão ignorantes que nem um dicionário sabemos consultar. O que sei é que me enoja ouvir comentários desta natureza.
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terça-feira, 29 de setembro de 2009
sábado, 26 de setembro de 2009
Dia de reflexão
Uma ova. "Pensar incomoda como andar à chuva". Foi dia de vindima. Sem metafísica. Com esforço e muita transpiração, porque o calor apertava e o rancho do costume estava muito desfalcado. É a vida.
Colheita fraca, mas promissora. Fotos aqui. E uns versos de Cesário, que o Tempo não desactualizou:
Colheita fraca, mas promissora. Fotos aqui. E uns versos de Cesário, que o Tempo não desactualizou:
"Oh! Que grande alegria eu tenho quando
Sou tal e qual como os mais! E, sem talento,,
Faço um trabalho técnico, violento,
Cantando, praguejando, batalhando!"
"Hoje eu sei quanto custam a criar
As cepas, desde que eu as podo e empo.
Ah! O campo não é um passatempo
Com bucolismos, rouxinóis, luar.
A nós tudo nos rouba e dizima:
(...)
E o pulgão, a lagarta, os caracóis,
E há inda, além do mais com que se ateima,
As intempéries, o granizo, a queima,
E a concorrência com os espanhóis."
Cesário Verde, "Nós"
Sou tal e qual como os mais! E, sem talento,,
Faço um trabalho técnico, violento,
Cantando, praguejando, batalhando!"
"Hoje eu sei quanto custam a criar
As cepas, desde que eu as podo e empo.
Ah! O campo não é um passatempo
Com bucolismos, rouxinóis, luar.
A nós tudo nos rouba e dizima:
(...)
E o pulgão, a lagarta, os caracóis,
E há inda, além do mais com que se ateima,
As intempéries, o granizo, a queima,
E a concorrência com os espanhóis."
Cesário Verde, "Nós"
terça-feira, 22 de setembro de 2009
Da vulgaridade
Na literatura, choca-me a vulgaridade, a ordinarice, o palavrão escusado. Entenda-se: não são as situações vulgares, ordinárias, as palavras obscenas que me chocam; é o facto de o escritor não ter feito o seu trabalho escolhendo o ângulo adequado, a perspectiva certa, o termo que a situação exige, seja ele ou não do calão. O que me choca é o recurso à vulgaridade para, simplesmente, disfarçar o não saber escrever, a falta de talento. Por exemplo, Justine ou os infortúnios da virtude, do Marquês de Sade, é um livro muito bom e muito bem escrito apesar da baixeza das situações e das personagens; Aquele Verão em Paris, de Abba Dawesar, com personagens requintadas e ambiente selecto, prima pela vulgaridade. E, antes que alguém mo recorde, qualquer um dos meus romances tem palavrões e situações vulgares. Indispensáveis e insubstituíveis, espero.
domingo, 20 de setembro de 2009
sábado, 19 de setembro de 2009
Casamento da Sofia
Casa hoje à tarde a Sofia, a minha menina mais nova. Ao contrário dos pais, que como muitos outros casais da nossa geração, o fizeram em cerimónia simples - espartana, no nosso caso -, organizou, com o noivo, o Nuno, cerimónia solene. Espero, troca-tintas como sou, sem experiência em casamentos formais nem gosto por rituais, não borrar a escrita.
FOTO: os noivos no casamento do primo Jorge, há dois meses
sexta-feira, 18 de setembro de 2009
Álcool provável
quarta-feira, 16 de setembro de 2009
Luso-Poemas encerra
Primeiro foi Escrita Criativa, agora Luso-Poemas. Ignoro o motivo, mas não me surpreenderia que se devesse às constantes questiúnculas internas, conjugadas com a incapacidade de avaliar criticamente os materiais publicados. Explico-me: não faltam por aí poetas e poetisas inspirados, convencidos de que basta derramar sentimentos como derramam lágrimas para que surja poesia. E tão convencidos estão do valor actual das suas composições que qualquer crítica, por muito modalizada que seja, é recebida não com agradecimentos, mas com insultos. Na melhor das hipóteses responderão que é assim que gostam de escrever e ponto final (ou, como escreve Mia Couto, "pronto. Final").
Esta reacção arrogante à crítica foi especialmente evidente no Escrita Criativa, projecto que, no entanto, poderia ter contribuído positivamente para a divulgação de novos autores, se a parte ruidosa dos utilizadores do site tivesse conseguido perceber e aceitar que para escrever é preciso, (i) antes de mais, saber escrever, (ii) ler os outros, muito e constantemente, (iii) trabalhar incessantemente, sobrepondo à inspiração as virtudes terapêuticas da transpiração. Ambos os projectos foram também seriamente prejudicados por engraçadinhos que, sempre escondidos atrás de inúmeros nicknames, avacalharam os sites e provocaram a saída de autores sérios e empenhados no trabalho. Destes últimos, ficam as saudades da leitura quase diária dos seus textos, alguns deles muito promissores, e a certeza de que encontrarão outras formas de os continuar a divulgar.
Por fim, uma palavra de solidariedade para com os responsáveis por ambos os projectos, esperando que as desilusões e os prejuizos económicos sofridos os não levem a abandonar o sonho de criar um dia um portal aberto e democrático da literatura 'não oficial'. A ambos, o meu reconhecimento sincero.
Correcção: no dia seguinte Luso-Poemas voltou a funcionar, sem quaisquer explicações por parte do administrador. Aparentemente, o mau ambiente persiste, pelo que entendo não haver motivos para apagar ou para corrigir o presente texto. Também a EditonWeb, projecto em que depositei grandes esperanças parece ter fechado portas após muitos meses de coma profundo.
Esta reacção arrogante à crítica foi especialmente evidente no Escrita Criativa, projecto que, no entanto, poderia ter contribuído positivamente para a divulgação de novos autores, se a parte ruidosa dos utilizadores do site tivesse conseguido perceber e aceitar que para escrever é preciso, (i) antes de mais, saber escrever, (ii) ler os outros, muito e constantemente, (iii) trabalhar incessantemente, sobrepondo à inspiração as virtudes terapêuticas da transpiração. Ambos os projectos foram também seriamente prejudicados por engraçadinhos que, sempre escondidos atrás de inúmeros nicknames, avacalharam os sites e provocaram a saída de autores sérios e empenhados no trabalho. Destes últimos, ficam as saudades da leitura quase diária dos seus textos, alguns deles muito promissores, e a certeza de que encontrarão outras formas de os continuar a divulgar.
Por fim, uma palavra de solidariedade para com os responsáveis por ambos os projectos, esperando que as desilusões e os prejuizos económicos sofridos os não levem a abandonar o sonho de criar um dia um portal aberto e democrático da literatura 'não oficial'. A ambos, o meu reconhecimento sincero.
Correcção: no dia seguinte Luso-Poemas voltou a funcionar, sem quaisquer explicações por parte do administrador. Aparentemente, o mau ambiente persiste, pelo que entendo não haver motivos para apagar ou para corrigir o presente texto. Também a EditonWeb, projecto em que depositei grandes esperanças parece ter fechado portas após muitos meses de coma profundo.
terça-feira, 15 de setembro de 2009
segunda-feira, 14 de setembro de 2009
O agoireiro
"O director-geral da Saúde (DGS) congratulou-se, esta segunda-feira, por Portugal não ter registado qualquer morte associada à gripe A, mas alertou que esta situação não vai manter-se, prevendo que a crise causada pela epidemia dure até dois anos. Contudo, o especialista em saúde pública alertou: «Não vamos continuar com uma letalidade de zero.»" (Extraído do Sapo)
Todos sabemos que vamos morrer um dia, não precisamos que o director-geral de Saúde (DGS, que sigla estranha!) o venha recordar. Afinal, é pago para nos manter vivos e de saúde, ou para agoirar a nossa morte?
Ternura e cultura
Sexta à noite, após o jantar, sentei-me sozinho no meu quintal a saborear o fresco. O Afonso, tendo dado pela minha falta, chegou e sentou-se a meu lado.
-- Avô, queres um JB? (Sim, já lhe ensinei essas duas letras).
-- Já não há, o avô já o bebeu todo.
-- Há no armário, respondeu, sempre convencido e confiante, e entrou em casa. Regressou desolado:
-- Já não há...
domingo, 13 de setembro de 2009
Vida de cão
Era um rafeiro chato: sempre que passeava pela rua, cheirava cuidadosamente cada parede, cada poste, cada automóvel estacionado, procurando marcas de outro cão que primeiro por lá tivesse passado; quando as detectava, prontamente urinava em cima, às vezes só pingos simbólicos, tendo já esgotado no percurso a reserva hídrica que acumulava penosamente ao longo de todo o dia – mas contava a intenção: a última palavra havia por força de ser a sua, mesmo que nada significasse.
Os outros, fechados nos quintais onde descansavam do passeio diário, talvez dormitando enquanto sonhavam deliciados com a cadela do fundo da rua, que, mais dia, menos dia, há-de entrar em cio, soerguiam uma orelha e, se mais vividos, soltavam rosnadela quase imperceptível: -- Lá anda aquele filho de uma cadela!; se jovens e impetuosos, corriam devastando relvados e flores, atiravam-se furiosos ao portão, impotentes para impedir o sacana de sobrepor as marcas do seu egoísmo, como se paredes, postes e carros não fossem suficientes para todos – ou se em cada mijadela alheia visse a evidência da sua mediocridade.
Os outros, fechados nos quintais onde descansavam do passeio diário, talvez dormitando enquanto sonhavam deliciados com a cadela do fundo da rua, que, mais dia, menos dia, há-de entrar em cio, soerguiam uma orelha e, se mais vividos, soltavam rosnadela quase imperceptível: -- Lá anda aquele filho de uma cadela!; se jovens e impetuosos, corriam devastando relvados e flores, atiravam-se furiosos ao portão, impotentes para impedir o sacana de sobrepor as marcas do seu egoísmo, como se paredes, postes e carros não fossem suficientes para todos – ou se em cada mijadela alheia visse a evidência da sua mediocridade.
quinta-feira, 10 de setembro de 2009
Incêndio
"É então que o sino toca freneticamente a rebate, tlim, tlim, tlim... Fogo!, arrepia-se o João e salta em ceroulas até à janela e olha em volta; não, não há labaredas nas imediações, ameaçando a sua casa; mais calmo, chega à porta, ao mesmo tempo que os pais e a irmã, todos ansiosos, sabendo que, como diz o povo, o fogo é pior do que um ladrão; a mãe, mais experiente, aperta o lenço à cabeça e corre já de balde na mão enquanto o pai vai à adega procurar enxada, que nas mãos de um homem serve para combater tudo menos o mau olhado; só a irmã, consciente das suas limitações de rapariga, fica em casa e o despacha, com a incumbência de a vir avisar se o fogo se aproximar.
Pela rua abaixo, mulheres gritam, correm homens e rapazes, perguntando uns contra os outros onde é o fogo; e uns afiançam que é na Charneca, porque o povo se apressa nessa direcção, outros gritam que é no Outeirinho, porque o clarão do incêndio parece vir de lá, todos correm feitos um rio humano que quer dar combate ao inimigo antes que ganhe forças e devaste a povoação. Logo avistam, subindo do tear do Abel, labaredas medonhas que cortam a chuvinha e a negrura da noite, rolos de fumo que descem asfixiantes, envolvendo os gritos de medo, de desespero, de incentivo, cada qual querendo ser o primeiro, e eis mulheres que acorrem, umas carregando baldes nas mãos, outras canecos e almudes à cabeça, enchidos no poço mais próximo, felizmente logo do outro lado da rua, eis homens valentes que entram pelo tear adentro, protegendo com boinas e bonés a face das chamas que lhes chamuscam cabelo e barbas por fazer, e eles deitam abaixo barrotes e madeiros inflamados, e eis que o telhado ameaça desabar e gritam, --- Fujam, fujam, que morremos aqui, prontamente todos recuam, e é com a raiva da impotência que vêem as chamas tomarem conta do negócio do Abel e do emprego certo de uma dúzia de mulheres. Ah, mas não vão ceder, pelo menos sem luta árdua, e mal o telhado desaba, atiram-se novamente para o brasido, pisam-no com as fortes botas de cavador, lançam terra com as enxadas, despejam baldes e canecos que as mulheres lhes passam, e a água prontamente estruge, guincha, evapora-se em rolos de fumo. É então que o Abel chega com um motor de rega, rapidamente se estendem as mangueiras, se ferra o chupador e, após esforços para o fazer pegar, a água jorra em abundância e as chamas recuam, aliviando o povo que aproveita para respirar um pouco e endireitar as costas, já de si doridas de toda uma vida de enxada.
--- Ah, o progresso!, comenta-se, vendo como uma única máquina desenvolve mais trabalho do que uma multidão exausta, mas pouco depois o motor tosse, engasga-se, a preocupação espelha-se em todos os rostos, parece que vai parar, --- Que será? Falta de gasolina?, e prontamente, não imagino saída de onde, surge uma lata de combustível, mas, na quase escuridão, atabalhoados, nervosos, não acertam com o bujão do motor, e é mais o líquido entornado do que o que entra no reservatório. Logo, logo, o Gamela teve ideia luminosa: acendeu um fósforo e chegou-o ao depósito para que vissem o que faziam. Foi um estoiro. Aqueles que atestavam o motor foram lançados a metros de distância, tombando chamuscados, alguns com o cabelo ou a roupa a arder, não sei se da gasolina inflamada, se da raiva que os consumia; outros, mais afastados, dando vazão ao sentimento justiceiro do povo, expulsam dali o rapaz à força de sopapos e de pontapés no traseiro, e ele, lesto, esgueira-se, as atenções momentaneamente distraídas com o uivo da sirene dos bombeiros que finalmente chegam e depressa extinguirão o incêndio --- afinal, já quase tudo tinha ardido naquele barracão.
Aliviados, regressam aos poucos a casa, ainda lentamente, olhando frequentemente para trás, tossindo devido à fumaça que o rescaldo elevou e agora envolve a povoação, sempre comentando uns com os outros que podia ter sido bem pior se não tivessem evitado que o fogo chegasse às casas próximas; é agitados que se deitam novamente e por isso demoram a adormecer, apesar de a noite decorrer agora sossegada, sem roncos, nem gemidos amorosos, nem ralhos, apenas ao longe o ruído grave dos motores que inundam o tear do Abel, entrecortado pelo ladrar à desgarrada dos cães acorrentados nos quintais, alvoroçados pela agitação, incomodados por solidão e por carraças."
Inédito meu
Pela rua abaixo, mulheres gritam, correm homens e rapazes, perguntando uns contra os outros onde é o fogo; e uns afiançam que é na Charneca, porque o povo se apressa nessa direcção, outros gritam que é no Outeirinho, porque o clarão do incêndio parece vir de lá, todos correm feitos um rio humano que quer dar combate ao inimigo antes que ganhe forças e devaste a povoação. Logo avistam, subindo do tear do Abel, labaredas medonhas que cortam a chuvinha e a negrura da noite, rolos de fumo que descem asfixiantes, envolvendo os gritos de medo, de desespero, de incentivo, cada qual querendo ser o primeiro, e eis mulheres que acorrem, umas carregando baldes nas mãos, outras canecos e almudes à cabeça, enchidos no poço mais próximo, felizmente logo do outro lado da rua, eis homens valentes que entram pelo tear adentro, protegendo com boinas e bonés a face das chamas que lhes chamuscam cabelo e barbas por fazer, e eles deitam abaixo barrotes e madeiros inflamados, e eis que o telhado ameaça desabar e gritam, --- Fujam, fujam, que morremos aqui, prontamente todos recuam, e é com a raiva da impotência que vêem as chamas tomarem conta do negócio do Abel e do emprego certo de uma dúzia de mulheres. Ah, mas não vão ceder, pelo menos sem luta árdua, e mal o telhado desaba, atiram-se novamente para o brasido, pisam-no com as fortes botas de cavador, lançam terra com as enxadas, despejam baldes e canecos que as mulheres lhes passam, e a água prontamente estruge, guincha, evapora-se em rolos de fumo. É então que o Abel chega com um motor de rega, rapidamente se estendem as mangueiras, se ferra o chupador e, após esforços para o fazer pegar, a água jorra em abundância e as chamas recuam, aliviando o povo que aproveita para respirar um pouco e endireitar as costas, já de si doridas de toda uma vida de enxada.
--- Ah, o progresso!, comenta-se, vendo como uma única máquina desenvolve mais trabalho do que uma multidão exausta, mas pouco depois o motor tosse, engasga-se, a preocupação espelha-se em todos os rostos, parece que vai parar, --- Que será? Falta de gasolina?, e prontamente, não imagino saída de onde, surge uma lata de combustível, mas, na quase escuridão, atabalhoados, nervosos, não acertam com o bujão do motor, e é mais o líquido entornado do que o que entra no reservatório. Logo, logo, o Gamela teve ideia luminosa: acendeu um fósforo e chegou-o ao depósito para que vissem o que faziam. Foi um estoiro. Aqueles que atestavam o motor foram lançados a metros de distância, tombando chamuscados, alguns com o cabelo ou a roupa a arder, não sei se da gasolina inflamada, se da raiva que os consumia; outros, mais afastados, dando vazão ao sentimento justiceiro do povo, expulsam dali o rapaz à força de sopapos e de pontapés no traseiro, e ele, lesto, esgueira-se, as atenções momentaneamente distraídas com o uivo da sirene dos bombeiros que finalmente chegam e depressa extinguirão o incêndio --- afinal, já quase tudo tinha ardido naquele barracão.
Aliviados, regressam aos poucos a casa, ainda lentamente, olhando frequentemente para trás, tossindo devido à fumaça que o rescaldo elevou e agora envolve a povoação, sempre comentando uns com os outros que podia ter sido bem pior se não tivessem evitado que o fogo chegasse às casas próximas; é agitados que se deitam novamente e por isso demoram a adormecer, apesar de a noite decorrer agora sossegada, sem roncos, nem gemidos amorosos, nem ralhos, apenas ao longe o ruído grave dos motores que inundam o tear do Abel, entrecortado pelo ladrar à desgarrada dos cães acorrentados nos quintais, alvoroçados pela agitação, incomodados por solidão e por carraças."
Inédito meu
quarta-feira, 9 de setembro de 2009
Incêndio
"O ano anterior, 1931, fora um ano de seca terrível, como só haverá outra parecida no próximo século. Secaram as ribeiras de todo o ano, secaram as próprias nascentes, obrigando as mulheres a passar as noites de Verão na fonte, aguardando a vez para, pingo a pingo, encherem cântaros, canecos e bilhas enquanto aproveitam para pôr as conversas em dia. E quando a estiagem infernal estava prestes a terminar, os Montes arderam.
Nesse dia, o Jaime acordara com uma ligeira dor de cabeça, que piorava à imagem do tempo, cada vez mais pesado, cada vez mais soturno; de uma moinha tornara-se num latejar cada vez mais forte, como se a cabeça fosse rebentar, doendo ao menor movimento, disposição a condizer: rabugem, irascibilidade, impaciência para consigo próprio e para com os outros. Para piorar, tivera de ir enxofrar a vinha das Mogueiras, onde, vira na véspera, o oídio já entrara, apodrecendo precocemente os cachos de uvas.
O enxofre saía da torpilha e envolvia-o, colando-se-lhe às mãos, à face, dando-lhe um ar de Satanás amarelento e sulfuroso, naquele trabalho de inferno, sob um sol também ele amarelado e diabólico, que o queimava por fora enquanto o enxofre ardia por dentro, abrasando pulmões, garganta, secando narinas e boca... Encharcada pelo suor, a roupa colava-se-lhe ao corpo, assando-lhe os sovacos, as virilhas... Nem os pés escapavam, roídos pelas duras botas, que nem o sebo amaciava já, e que o arrastavam veloz de cepa em cepa, sempre envolvido na nuvem sulfurosa que acabaria com o cinzeiro, se não acabasse com ele primeiro...
De tempos a tempos, levantava a cabeça para olhar o céu, receando que as pesadas nuvens desabassem sobre a terra sequiosa, o que, pensava, se aliviaria a pressão na sua cabeça, deitaria a perder o seu trabalho, lavando o enxofre que penosamente aplicava sobre parras e cachos de uvas. Tinha acabado de despegar quando o céu explodiu em fogo e vento; o dia fez-se subitamente noite e a noite se tornava dia rasgada pela luz arrepiante dos relâmpagos. Nos Montes, as mulheres que preparavam já a ceia, estremeceram apavoradas com o ribombar dos trovões e de imediato entoaram a ladainha da Santa Bárbara, esperando que lhes acudisse na desgraça iminente:
Foi uma guerra antecipadamente perdida. Os campos secos incendiaram-se como um fósforo e as labaredas, empurradas pelo vendaval terrível que se levantara, atacaram os currais, os palheiros, as adegas e até as casas da periferia; o povo desuniu-se e cada qual procurou salvar o seu e acudir aos seus, permitindo que as chamas entrassem pelos Montes adentro, pelo Pátio dos Vieiras, inflamando as casas como fogueiras de Santo António, uma após outra, até à Rua Principal.
Desesperado, que também a sua casa pegava fogo, o regedor correu para o posto público, na loja da Tia Joaquina, e telefonou para Alcobaça, suplicando ajuda. O presidente da Câmara, alarmado com os gritos que ouvia distintamente pelo telefone, chegou à rua e vendo o clarão que iluminava o céu, disse: — Acudamos depressa, senão os Montes morrem queimados!
Chegou quase uma hora depois, à frente dos bombeiros, e logo se atiraram todos ao combate desigual, trazendo alento ao povo já exausto; porém, dos Montes só restaria um brasido se não tivesse chegado ajuda vinda do Alto, como se Deus se tivesse apiedado ou então considerasse suficiente o castigo: desabou uma tromba de água, e o povo, cristão e ateu, caiu de joelhos, entoando Bendito seja o Senhor lá nas alturas! As chamas enfraqueceram e homens, mulheres e garotos, molhados que nem pintos, tremendo de frio e ardendo em calor, conseguiram até à madrugada circunscrever os incêndios, apartando-os uns dos outros.
O nascer do dia mostrou a devastação, cada qual avaliando os prejuízos, procurando ainda salvar relógio de sala, cadeira, ou galinha; então, ergueu-se em uníssono um coro de lamentações, como se as mulheres carpissem em simultâneo a morte de todos os homens da aldeia; não, elas choravam a perda dos parcos haveres, o sofrimento futuro, sem tecto, sem mobiliário, sem gado, sem ninguém que lhes acudisse, enquanto davam punhadas no próprio peito, arrancavam os cabelos, rasgavam os joelhos pelas pedras da rua: — Valei-me, Senhora de Fátima, que irá ser de mim e dos meus meninos? Depois, tendo carpido as perdas próprias e alheias, com a coragem do desespero, tocaram mais uma vez a burra para diante."
Entre Cós e Alpedriz
Nesse dia, o Jaime acordara com uma ligeira dor de cabeça, que piorava à imagem do tempo, cada vez mais pesado, cada vez mais soturno; de uma moinha tornara-se num latejar cada vez mais forte, como se a cabeça fosse rebentar, doendo ao menor movimento, disposição a condizer: rabugem, irascibilidade, impaciência para consigo próprio e para com os outros. Para piorar, tivera de ir enxofrar a vinha das Mogueiras, onde, vira na véspera, o oídio já entrara, apodrecendo precocemente os cachos de uvas.
O enxofre saía da torpilha e envolvia-o, colando-se-lhe às mãos, à face, dando-lhe um ar de Satanás amarelento e sulfuroso, naquele trabalho de inferno, sob um sol também ele amarelado e diabólico, que o queimava por fora enquanto o enxofre ardia por dentro, abrasando pulmões, garganta, secando narinas e boca... Encharcada pelo suor, a roupa colava-se-lhe ao corpo, assando-lhe os sovacos, as virilhas... Nem os pés escapavam, roídos pelas duras botas, que nem o sebo amaciava já, e que o arrastavam veloz de cepa em cepa, sempre envolvido na nuvem sulfurosa que acabaria com o cinzeiro, se não acabasse com ele primeiro...
De tempos a tempos, levantava a cabeça para olhar o céu, receando que as pesadas nuvens desabassem sobre a terra sequiosa, o que, pensava, se aliviaria a pressão na sua cabeça, deitaria a perder o seu trabalho, lavando o enxofre que penosamente aplicava sobre parras e cachos de uvas. Tinha acabado de despegar quando o céu explodiu em fogo e vento; o dia fez-se subitamente noite e a noite se tornava dia rasgada pela luz arrepiante dos relâmpagos. Nos Montes, as mulheres que preparavam já a ceia, estremeceram apavoradas com o ribombar dos trovões e de imediato entoaram a ladainha da Santa Bárbara, esperando que lhes acudisse na desgraça iminente:
Santa Bárbara, bendita
que nos céus está escrita
a papel e água benta
levai para longe esta tormenta
para onde não haja garfo nem colher
nem vaca nem vitelo
nem homem nem mulher...
Grandes deviam ser os pecados do Homem, porque a tormenta, em vez de se afastar, aproximou-se e já não era só o firmamento que despejava fogo sobre a terra, era também a terra que crescia em labaredas ao encontro daquelas que desciam do céu: com um ruído assustador, levantara-se pouco antes um vento quente e seco, que rapidamente espalhou em todas as direcções as chamas que os raios haviam ateado. Então céu e terra uniram-se, tudo vermelho, tudo chamas, sem piedade pela vida de árvores, animais e pessoas. O sino tocou a rebate, o povo saiu à rua, carregando baldes, canecos, almudes e enxadas, sob o uivo fúnebre das mulheres, que carpiam já a desgraça pressentida, todos sabendo que o fogo é pior do que um ladrão, pois não se contenta em roubar e em matar, precisa de destruir tudo por onde passa.que nos céus está escrita
a papel e água benta
levai para longe esta tormenta
para onde não haja garfo nem colher
nem vaca nem vitelo
nem homem nem mulher...
Foi uma guerra antecipadamente perdida. Os campos secos incendiaram-se como um fósforo e as labaredas, empurradas pelo vendaval terrível que se levantara, atacaram os currais, os palheiros, as adegas e até as casas da periferia; o povo desuniu-se e cada qual procurou salvar o seu e acudir aos seus, permitindo que as chamas entrassem pelos Montes adentro, pelo Pátio dos Vieiras, inflamando as casas como fogueiras de Santo António, uma após outra, até à Rua Principal.
Desesperado, que também a sua casa pegava fogo, o regedor correu para o posto público, na loja da Tia Joaquina, e telefonou para Alcobaça, suplicando ajuda. O presidente da Câmara, alarmado com os gritos que ouvia distintamente pelo telefone, chegou à rua e vendo o clarão que iluminava o céu, disse: — Acudamos depressa, senão os Montes morrem queimados!
Chegou quase uma hora depois, à frente dos bombeiros, e logo se atiraram todos ao combate desigual, trazendo alento ao povo já exausto; porém, dos Montes só restaria um brasido se não tivesse chegado ajuda vinda do Alto, como se Deus se tivesse apiedado ou então considerasse suficiente o castigo: desabou uma tromba de água, e o povo, cristão e ateu, caiu de joelhos, entoando Bendito seja o Senhor lá nas alturas! As chamas enfraqueceram e homens, mulheres e garotos, molhados que nem pintos, tremendo de frio e ardendo em calor, conseguiram até à madrugada circunscrever os incêndios, apartando-os uns dos outros.
O nascer do dia mostrou a devastação, cada qual avaliando os prejuízos, procurando ainda salvar relógio de sala, cadeira, ou galinha; então, ergueu-se em uníssono um coro de lamentações, como se as mulheres carpissem em simultâneo a morte de todos os homens da aldeia; não, elas choravam a perda dos parcos haveres, o sofrimento futuro, sem tecto, sem mobiliário, sem gado, sem ninguém que lhes acudisse, enquanto davam punhadas no próprio peito, arrancavam os cabelos, rasgavam os joelhos pelas pedras da rua: — Valei-me, Senhora de Fátima, que irá ser de mim e dos meus meninos? Depois, tendo carpido as perdas próprias e alheias, com a coragem do desespero, tocaram mais uma vez a burra para diante."
Entre Cós e Alpedriz
Sexo e género
Está na moda, e é certamente politicamente correcto, falar em "igualdade de género", "violência de género". Não deixa, no entanto, de ser um tremendo disparate, ao confundir o cu com as calças.
Sexo é biológico; género é gramatical. A primeira categoria pode assumir três valores: macho, fêmea e, suponho, hermafrodita (que os biólogos me desculpem alguma incorrecção). O género, em Português, têm dois valores: masculino e feminino, embora noutras línguas exista o género neutro. "Livro" é, em Português, do género masculino e não tem sexo. Certo?
Sexo é biológico; género é gramatical. A primeira categoria pode assumir três valores: macho, fêmea e, suponho, hermafrodita (que os biólogos me desculpem alguma incorrecção). O género, em Português, têm dois valores: masculino e feminino, embora noutras línguas exista o género neutro. "Livro" é, em Português, do género masculino e não tem sexo. Certo?
terça-feira, 8 de setembro de 2009
Nas curvas de Cós
"--- Ou volta connosco para Pombal, ou sai aqui e vai à boleia. Duvida: a esta hora, quem parará? Mas não tem outra solução e é isso que faz, com tanto azar que o deixam junto a um cemitério, raio de lugar, raio de hora, como chegará a casa, a uns bons trinta quilómetros? Meia hora depois, avista uns faróis, pede insistentemente boleia, o carro afrouxa, chiam os pneus com a brusquidão da travagem, ainda tenta explicar-se, mas interrompe-o voz apressada: --- Entre!
É médico e já devia estar há horas no hospital de Alcobaça, atrasou-o outro parto que correu mal, imagina rindo a fúria da parturiente que o aguarda gritando com dores, as imprecações da parteira, uma e outra supondo-o no conforto de cama de amante ou em farra bem bebida --- se é homem há que esperar o pior, dir-lhes-á a sabedoria feminina. Não está incomodado, insultos e pragas aliviam o sofrimento de uma e a aflição da outra, e talvez entretanto a criança nasça sem a sua ajuda, poupando-lhe o trabalho de a pôr cá fora. É também aflito que o João se retesa e segura ao que pode, enquanto o doutor, divertido, troça dos seus receios, estranhos em quem pede boleia à porta do cemitério à meia-noite: parara convencido de que fosse alma penada que quisesse fugir de lugar tão solitário... O João, desesperadamente agarrado à porta para evitar cair em cima do doutor nas curvas, para não ser projectado nas travagens nem bater com a nuca nas acelerações, que, embora o veículo tenha já cinto de segurança não sabe como o pôr nem se atreveria a fazê-lo, ofendendo o condutor, aproveita uma recta para se explicar: tinha ido visitar a namorada, adormecera na camioneta e perdera a ligação...
É médico e já devia estar há horas no hospital de Alcobaça, atrasou-o outro parto que correu mal, imagina rindo a fúria da parturiente que o aguarda gritando com dores, as imprecações da parteira, uma e outra supondo-o no conforto de cama de amante ou em farra bem bebida --- se é homem há que esperar o pior, dir-lhes-á a sabedoria feminina. Não está incomodado, insultos e pragas aliviam o sofrimento de uma e a aflição da outra, e talvez entretanto a criança nasça sem a sua ajuda, poupando-lhe o trabalho de a pôr cá fora. É também aflito que o João se retesa e segura ao que pode, enquanto o doutor, divertido, troça dos seus receios, estranhos em quem pede boleia à porta do cemitério à meia-noite: parara convencido de que fosse alma penada que quisesse fugir de lugar tão solitário... O João, desesperadamente agarrado à porta para evitar cair em cima do doutor nas curvas, para não ser projectado nas travagens nem bater com a nuca nas acelerações, que, embora o veículo tenha já cinto de segurança não sabe como o pôr nem se atreveria a fazê-lo, ofendendo o condutor, aproveita uma recta para se explicar: tinha ido visitar a namorada, adormecera na camioneta e perdera a ligação...
Depois, sério, vendo a cara inocente do rapaz, dá conselhos, os quais, como sempre sucede com todos nós, só serão tomados, se o forem, tarde de mais. Diz-lhe que o comportamento feminino é frequentemente imprevisível, porque homens e mulheres pensam e reagem de diferentes maneiras, dão diferente importância às coisas... O João ouve-o, embora a atenção se concentre na estrada, como ele próprio gostaria que o médico também fizesse, olhando para o caminho em vez de o olhar nos olhos quando fala, bom seria também que não tirasse as mãos do volante para gesticular... Vendo que o pendura está mais preocupado com a sua condução “agressiva”, como a caracteriza, do que com os conselhos que prodigaliza, lembra-lhe que ele próprio trava quando entender necessário, não precisa o João de o fazer, nem de se inclinar nas curvas, que não vão de mota... Agora as mulheres, insiste, talvez por as considerar especialidade sua, pela profissão e pela importância que lhes dá fora dela, as mulheres podem ser, e são frequentemente, um problema, porque os homens as não compreendem nem são ensinados a fazê-lo.
--- Por exemplo, há mulheres que no período mudam por completo de comportamento, tornando-se agressivas, más, embirrantes, entendendo que por elas passarem mal os companheiros se devem desfazer em atenções, quando muitas vezes eles nem sequer sabem do sofrimento que as aflige --- mas se gostassem realmente delas, deviam adivinhá-lo, sem que fosse preciso explicar-lhes, pensam elas.
--- Olhe, continua, conheci casos de casais com óptimo relacionamento que acabaram por se separar por causa desta incompreensão, elas ofendidas com a falta de solidariedade para com os tormentos delas, tão zangadas ficavam que acabada a menstruação os continuavam a privar da ração ou, se acaso entretanto faziam as pazes, entretanto começava novo período... Um círculo vicioso, está a ver, não é?
Mas o que o João via era a morte diante dos olhos: chiavam pneus, os faróis devassavam a noite, árvores e muros corriam loucamente direito ao carro e desviavam-se no último momento, o cheiro da borracha queimada penetrava novamente no interior do veículo... A dada altura, uma nuvem de centelhas chispou quando a parede de uma casa se não arredou, mas o médico nem sequer afrouxou:
--- Deixe lá, é só chapa riscada, o seguro paga a pintura. Onde é que você mora?
E insistiu em o deixar em casa, para terror do João, ao imaginar aquela condução louca pelas curvas de Cós acima. Tinha razão em se assustar, que o médico parecia querer antecipar o lema que o povo dos Montes defendeu nos anos noventa, sem conseguir convencer o Presidente da Câmara: Vamos fazer das curvas uma recta! Por várias vezes o carro teve pelo menos uma roda no precipício, chegou a entrar pelo atalho e após saltos violentos, apercebendo-se de que a o caminho não era por ali, acelerou em marcha-atrás, enquanto os cabelos do João se punham em pé ao ver a velocidade a que recuavam sem que fosse possível descortinar na escuridão os limites do abismo; na Curva da Segunda o automóvel derrapou tanto que quase fez inversão de marcha:
--- Isto sim, são curvas que dão luta! Hei-de cá voltar!
Subiam já em estrada melhor.
--- Olhe, tenho uns colegas com a mania dos ralis, vou desafiá-los para uma corridinha até cá acima."
Foto: as Curvas no Google Earth
Inédito meu. Ler mais
--- Por exemplo, há mulheres que no período mudam por completo de comportamento, tornando-se agressivas, más, embirrantes, entendendo que por elas passarem mal os companheiros se devem desfazer em atenções, quando muitas vezes eles nem sequer sabem do sofrimento que as aflige --- mas se gostassem realmente delas, deviam adivinhá-lo, sem que fosse preciso explicar-lhes, pensam elas.
--- Olhe, continua, conheci casos de casais com óptimo relacionamento que acabaram por se separar por causa desta incompreensão, elas ofendidas com a falta de solidariedade para com os tormentos delas, tão zangadas ficavam que acabada a menstruação os continuavam a privar da ração ou, se acaso entretanto faziam as pazes, entretanto começava novo período... Um círculo vicioso, está a ver, não é?
Mas o que o João via era a morte diante dos olhos: chiavam pneus, os faróis devassavam a noite, árvores e muros corriam loucamente direito ao carro e desviavam-se no último momento, o cheiro da borracha queimada penetrava novamente no interior do veículo... A dada altura, uma nuvem de centelhas chispou quando a parede de uma casa se não arredou, mas o médico nem sequer afrouxou:
--- Deixe lá, é só chapa riscada, o seguro paga a pintura. Onde é que você mora?
E insistiu em o deixar em casa, para terror do João, ao imaginar aquela condução louca pelas curvas de Cós acima. Tinha razão em se assustar, que o médico parecia querer antecipar o lema que o povo dos Montes defendeu nos anos noventa, sem conseguir convencer o Presidente da Câmara: Vamos fazer das curvas uma recta! Por várias vezes o carro teve pelo menos uma roda no precipício, chegou a entrar pelo atalho e após saltos violentos, apercebendo-se de que a o caminho não era por ali, acelerou em marcha-atrás, enquanto os cabelos do João se punham em pé ao ver a velocidade a que recuavam sem que fosse possível descortinar na escuridão os limites do abismo; na Curva da Segunda o automóvel derrapou tanto que quase fez inversão de marcha:
--- Isto sim, são curvas que dão luta! Hei-de cá voltar!
Subiam já em estrada melhor.
--- Olhe, tenho uns colegas com a mania dos ralis, vou desafiá-los para uma corridinha até cá acima."
Foto: as Curvas no Google Earth
Inédito meu. Ler mais
segunda-feira, 7 de setembro de 2009
sábado, 5 de setembro de 2009
A Oeste nada de novo
Agoniado com a campanha eleitoral tristonha e enfadonha, enojado com as matreirices que, de parte a parte, os nossos políticos inventam, mais preocupados em denegrir as propostas adversárias do que em evidenciar o mérito das próprias, sobretudo sem paciência para a novela A Manuela & a TVI, recordo-me de Camões:
"Não mais, Musa, não mais, que a lira tenho
Destemperada e a voz enrouquecida,
E não do canto, mas de ver que venho
Cantar a gente surda e endurecida.
O favor com que mais se acende o engenho
Não no dá a Pátria, não, que está metida
No gosto da cobiça e da rudeza
D'ua austera, apagada e vil tristeza."
"Não mais, Musa, não mais, que a lira tenho
Destemperada e a voz enrouquecida,
E não do canto, mas de ver que venho
Cantar a gente surda e endurecida.
O favor com que mais se acende o engenho
Não no dá a Pátria, não, que está metida
No gosto da cobiça e da rudeza
D'ua austera, apagada e vil tristeza."
terça-feira, 1 de setembro de 2009
Kara Té
A (Arte da) Mão Vazia.
Está na hora de recomeçar, perdendo aqueles quilitos extra que férias, sorna, cama e boa mesa acumularam. No programa pessoal, Jion e kumité. Está também previsto o regresso ao ensino (sempre gratuito) da arte, interrompido nos dois últimos anos por condicionalismos que estão, espero, ultrapassados.
Está na hora de recomeçar, perdendo aqueles quilitos extra que férias, sorna, cama e boa mesa acumularam. No programa pessoal, Jion e kumité. Está também previsto o regresso ao ensino (sempre gratuito) da arte, interrompido nos dois últimos anos por condicionalismos que estão, espero, ultrapassados.
Setembro
"Eis Setembro, que chega fresco e risonho como a Primavera, após outro Agosto infernal, de calor e de incêndios. Não nos iludamos: nada voltará a ser como dantes. Setembro jamais será Abril, mesmo que este Sol e esta luz nos queiram convencer de que a Primavera dura todo o ano e a juventude é eterna, mesmo que a cidade pareça a mesma, com o castelo indiferente à passagem dos séculos e o Lis correndo sempre ao encontro do irmão gémeo, para juntos procurarem o mar, sonho de todos os rios." Ler mais
Assim começa Do lacrau e da sua picada
(Imagem do pintor João Alfaro)
Assim começa Do lacrau e da sua picada
(Imagem do pintor João Alfaro)
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