Aprendi tarde, e mal, a andar de bicicleta. Não havia nenhuma em minha casa, o que me fazia sentir desfavorecido face a miúdos ainda mais pobres, os quais, embora sem altura para chegar do selim aos pedais, as montavam com as pernas por debaixo do quadro e se exibiam no adro em corridas e acrobacias.
É certo que o meu pai tinha motoreta, e então eram tão raras na aldeia como os automóveis. Mas nem me passava pela cabeça montar nela, cair certamente, amassar chapa, riscar a pintura; receava sobretudo que, por volta da meia noite, quando o meu pai lhe pegasse para sair, sempre atrasado para o trabalho distante, ela não trabalhasse, fazendo-o perder o dia, ameaçando até o emprego.
Um dia, um primo, uns anos mais velho, apareceu com bicicleta. Talvez do tio, já não sei. E lá vamos nós a correr pelas ruas, ele a pedalar, eu atrás apeado, esbaforido. A certa altura, propôs ensinar-me.
Comecei por recusar, a medo de cair. Ah, mas ele amparava a bicicleta, não me deixava cair!
Assim tranquilizado, montei a custo no selim, tentei chegar aos pedais.
— Não precisas, eu empurro, depois aprendes a dar meias pedaladas.
Poucos metros depois, já ele largava a bicicleta por breves momentos, e eu ganhava confiança. Até que, quase no fim da rua, entendeu terminada a lição, que a paciência das crianças é curta. E não encontrou melhor forma de marcar o final do que com violento empurrão no guiador, fazendo-me estatelar violentamente no pó da estrada.
Esfarrapado, dorido, chorei, protestei contra a estupidez do acto.
— Todos caem, precisavas de aprender!
Não voltei a montar em bicicleta até que, aí pelos meus dezoito anos, outro primo, mais novo, surgiu com velha pasteleira. Experimentei sozinho, rua abaixo, pouco depois já pedalava pelas ruas da aldeia, triunfante, eufórico, por, finalmente, ter aprendido algo que qualquer miúdo de seis anos fazia, e muito melhor do que eu.
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