Todos os sábados, ao anoitecer, chegava a casa a cair de bêbedo. Cabeça pendente sobre a mesa, enquanto aguardava as couves com feijões da ceia, ruminava as humilhações da semana, atacavam-no fúrias, esmurrava a mesa, ralhava, replicava aos apelos à contenção com berro herético: "Os colhōes do Padre Santo!".
Nem outros palavrões, nem outras blasfémias. E esta reservada para as bebedeiras. Tão violenta que jamais a esqueci e então receava que na rua o ouvissem os beatos "tus", assim chamados porque, dizia-se, entre eles todos se tratavam por tu independentemente das hierarquias sociais, e fizessem queixa ao padre, à polícia, à pide.
Cinquenta anos depois, matinalmente massacrado com as reportagens televisivas sobre as voltinhas do papamóvel na Praça de São Pedro, o anel, o palácio onde vai habitar e as suas divisões, os pormenores passados presentes e futuros -- e eu queria a meteorologia, que isso é que é serviço público, vital para a agricultura -- também eu berrei pelos colhōes do Padre Santo, ou será ele descolhoado, ou de tal detalhe, fundamental para a governação, se terá esquecido a douta enviada especial, que tudo o mais sabe, que de tudo o mais fala, que sobre todas as outras coisas opina?
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