Anda o Mundo conturbado, sempre atormentado por cataclismos, guerras e crises económicas, o país angustia-se, deprime-se, discute, toda a gente preocupada com a Euribor, o Benfica e a bancarrota iminente. Só eu me alheio e, em vez de fazer contas à vida, peregrinar de banco em banco na renegociação das dívidas, agitar semanalmente lenço branco pelos estádios, me manifestar, juntar-me ao coro que entoa o "Está na hora / de o governo ir embora...", atormento-me com outras ralações, que aos mais apenas despertam sorrisos de comiseração: já é outra vez Natal e ainda há pouco era Verão os dias, as semanas, os meses, as estações e os próprios anos passam sem que os consiga afrouxar um pouco, o prazer, quando o há, tem já travo amargo, que o Inverno se aproxima inexoravelmente...
Como o Cão, farejador que busca Sentido para o que É enquanto segue Órion, o amo, pelo firmamento, por entre poeiras, planetas, estrelas, constelações e mitos, assim sou eu, outro que busca uma resposta que permita, senão resolver o puzzle da vida e dos seus mistérios, pelo menos encaixar uma qualquer peça neste quebra-cabeças; como me poderia então comprazer com as coisas fúteis, aceitar viver um dia, uma hora que fosse, reduzindo o meu destino a um abaixo-assinado, a uma reivindicação, a um protesto, tomando o transitório por perene como as estrelas, repetitivo como a Noite, cíclico como as Estações, cumulativo como o Tempo, definitivo como a Morte?
Não se incomodem comigo, ignorem-me, vão sem mim renegociar os vossos créditos, xingar os árbitros, exigir a demissão do governo; porém, se um de vós, num qualquer dia em que acorde mal disposto, indignado com a ironia da Vida, que nos mostra a Beleza e se compraz em a destruir, nos dá Compreensão para mais sofremos com o fim dos outros e antecipadamente com o nosso, e tiver vontade e disposição então que folheie este livro, nem que seja para logo o pôr de lado com desprezo, porque pouco recreia, a ninguém esclarece, a nada responde.
As Plêiades, inédito
As Plêiades, inédito
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