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segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Não deserto do ensino

Não meti os papéis para a reforma hoje. Faltou-me a coragem. Afinal, é a minha vida desde 1976. Por pior que o ensino se tenha tornado, por pior que vá ficar --- e vai, não duvido, por muito que a minha ministra sorria --- não me imagino a viver fora dele. Eu sei, alguma vez terá de ser. Mas não hoje, mas não agora.
Nem preciso de inventar desculpas, argumentar com penalizações e quejandos. É só cobardia. Sem a minha profissão, sofreria do síndroma do membro amputado. É um sacerdócio, uma cruz que tenho de carregar, por sentido de dever, ou por não ser capaz de viver de outro modo. Não adianta arranjar desculpas.

2 comentários:

Reinaldo Amarante disse...

Não Zé. Não fales em sacerdócio, nem em cruzes. Fala em dever, em profissão, em vocação. Fala dos Alunos que formaste e te reconhecem e tu nem te lembras. Fala dos resultados que obtiveste com eles e que tanto orgulho te deram.
De resto, o dinheiro da reforma é importante, mas a tua sanidade mental e satisfação pessoal são muito mais. Acima de tudo, lembra-te que és um PROFISSIONAL e dos bons e PROFESSORES como tu fazem falta.

JCC disse...

Muito obrigado pelas palavras animadoras. Bem gostaria de acreditar que fazemos falta; mas receio que os responsáveis entendam que o que faz falta é sairmos de cena. O ensino que se tem vindo a impor pouco tem a ver connosco; talvez até nem precise de professores, uma vez que cada vez há menos para ensinar.
Eu era um professor de Português, com formação em Literatura e especialização em Linguística; hoje sou, cada vez mais e com grande desgosto, "acompanhante" de jovens mal formados, que me não querem sequer ouvir, simplesmente porque não estão para isso, nem para nada daquilo que a escola tem para lhes oferecer. (Que me desculpem os meus -- repito: meus -- alunos do Secundário; não é deles que estou a falar). Rara é a semana em que não faço várias vezes de palhaço em aulas de substituição, substituindo colegas com idade para serem meus filhos, sem plano de aula, sem saber sequer o que é que ali estou a fazer, avisado na hora, sem nenhum meio para impor ordem ou disciplina...
Rara é a semana sem duas ou três reuniões, cada uma mais produtiva que as outras, intermináveis e perfeitamente inúteis, excepto se se considerar a papelada nelas lida e produzida. Raro é o dia em que a gritaria infernal nos pavilhões, durante o tempo de aula, me não impede de ser ouvido pelos meus alunos dentro da minha sala...
Mas, apesar de tudo isto, de tantas outras coisas de que seria fastidioso falar, de tantas outras de que entendo não poder falar, fiquei. Não com a esperança de que isto melhore, bem pelo contrário; apenas porque, egoisticamente, não concebo a minha vida sem a escola, sem as minhas aulas, sem os meus alunos; as aulas dos outros professores, que as dêem eles --- afinal, quem é que recebe o ordenado para fazer esse trabalho?