Escrevi o "poema" que se segue, a itálico, aí por 1993/94, era Cavaco 1º ministro e Manuela Ferreira Leite a sua ministra da Educação. Portugal era então, diziam-nos, o bom aluno da CEE, de onde chegava dinheiro a rodos. Cavaco, sempre sibilino, dizia no Vale do Ave que era tempo de acabar com as despesas sumptuárias (sic), mas nada fazia para lhes pôr cobro, providenciando que os fundos comunitários fossem bem aplicados. Analfabetos foram formadores, "empresas" de formação proliferaram como larvas de vareja na carne apodrecida, empresários do têxtil e do calçado trocavam de carro -- e que carro -- quase mensalmente, fizeram-se autoestradas e os jipes que bebiam 16 aos 100 atafulharam-nas, "agricultores" que nunca pisaram a terra enriqueceram com os subsídios para tudo, até para não produzir, o novo-riquismo, ostensivo e grosseiro, sem volfrâmio nem ouro do Brasil, corrompeu tudo, desde aquilo que sempre esteve corrompido até aos valores que ainda subsistiam aqui e ali -- trabalho, dignidade, decência...
Nunca ninguém apreciou o meu "poema". Retomo-o hoje, dia das "medidas de redução do défice". Para recordar que os males que nos afligem começaram bem antes, com a destruição propositada e planeada da agricultura, das pescas, da indústria, do ensino... Só que, até pouco tempo tempo atrás, quase ninguém queria ver o que, no entanto, era evidente: se um país não produz, não é viável.
Portugal anos noventa
Destroçado pela derrota derramo minha amargura
Pelos caminhos deste país que já foi de vinho e mel
E a ela perdura, amarela e viscosa como fel,
Tingindo cada rosto, cada figura,
De lívida brancura
Já nada é como era dantes
e o cabelo que me vai faltando é apenas
breve indício do Inverno que se vem aproximando.
Mas o que me dói e não tem cura
neste entardecer azedo
é ver o país a adormecer cinzento
de indiferença e pasmo bafiento
Ninguém faz nada sem proveito.
Pelas auto-estradas que conduzem aos centros comerciais
telemóveis saúdam as novas catedrais
(Por aí fora, o abandono
Matas queimadas, hortas perdidas
peixes lançados ao mar
fábricas fechadas, reformas antecipadas
país de alheio dono
Desespero do desemprego, aldeias abandonadas
oh subsídio-servo-dependência!)
Não, nem orgulho ferido nem sonhos perdidos
agora já só o meu olhar camponês me magoa
como o mato à minha terra onde já nada é como dantes...
Chove no Verão, o Inverno aquece
E o nevoeiro não tece mistérios bastantes
outros que a miséria deste Portugal que esmorece
Só sei que de lado nenhum sairá a luz que rompe as trevas
porque já nem a noite é de breu
nem os dias resplandecem
e os amanhãs não cantam,
silenciosos como a nossa triste terra.
Destroçado pela derrota derramo minha amargura
Pelos caminhos deste país que já foi de vinho e mel
E a ela perdura, amarela e viscosa como fel,
Tingindo cada rosto, cada figura,
De lívida brancura
Já nada é como era dantes
e o cabelo que me vai faltando é apenas
breve indício do Inverno que se vem aproximando.
Mas o que me dói e não tem cura
neste entardecer azedo
é ver o país a adormecer cinzento
de indiferença e pasmo bafiento
Ninguém faz nada sem proveito.
Pelas auto-estradas que conduzem aos centros comerciais
telemóveis saúdam as novas catedrais
(Por aí fora, o abandono
Matas queimadas, hortas perdidas
peixes lançados ao mar
fábricas fechadas, reformas antecipadas
país de alheio dono
Desespero do desemprego, aldeias abandonadas
oh subsídio-servo-dependência!)
Não, nem orgulho ferido nem sonhos perdidos
agora já só o meu olhar camponês me magoa
como o mato à minha terra onde já nada é como dantes...
Chove no Verão, o Inverno aquece
E o nevoeiro não tece mistérios bastantes
outros que a miséria deste Portugal que esmorece
Só sei que de lado nenhum sairá a luz que rompe as trevas
porque já nem a noite é de breu
nem os dias resplandecem
e os amanhãs não cantam,
silenciosos como a nossa triste terra.
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