O júri da IIIª edição do Prémio Literário Irene Lisboa, promovido e organizado pelo Município de Arruda dos Vinhos e pela Biblioteca Irene Lisboa, entendeu distinguir, por unanimidade e entre cerca de duzentos trabalhos a concurso, o meu conto Crime na Capital. Orgulhoso da distinção, quero expressar a minha simpatia e a minha solidariedade a todos os concorrentes, e o desejo sincero de que não esmoreçam, antes persistam, nesta labuta insana da escrita, em que alguns, desconhecedores talvez das agruras do ofício, vêem prazer, como se prazer pudesse existir em tanto tempo de vida gasto em correcções sucessivas, na procura da toada e do ritmo adequados, na busca da palavra exacta...
Muito me honra e alegra receber este prémio, com patrona da envergadura intelectual e artística de Irene Lisboa, mulher distinta, professora emérita, poetiza e prosadora notável. Confesso que o prémio recebido compensou, de alguma forma, os momentos de dúvida, de desânimo, que rejeições de editores, desinteresse de críticos, por vezes provocam – embora reconheça que essas contrariedades reforçam a determinação e aumentam a vontade de continuar em frente, neste trabalho de Sísifo, que se não escolhe, antes nos surge imposto, poucas vezes obtém reconhecimento e, menos ainda, glória.
Crime na Capital inspirou-se em factos reais, um dos quais, o despedimento do engenheiro Eleutério, pareceu por demais inverosímil às minhas primeiras leitoras, a quem sempre dou a ler os originais antes de os considerar terminados. De facto, a realidade é frequentemente mais incrível do que a ficção, nomeadamente a triste realidade dos despedimentos, que atingem números jamais alcançados no nosso país, e assumem formas até há pouco inimagináveis, como por mensagens SMS. Também a história do mestre de karaté que faz peritagens de seguros e é alvejado durante um encontro amoroso ocorreu, infelizmente. Poderia, portanto, citar Camilo Castelo Branco (Vingança) “Não tenho imaginação, tenho memória”, se não tivesse recorrido abundantemente à imaginação para articular os eventos, concentrando numa única narrativa histórias diferentes, ocorridas com pessoas diferentes, em diferentes espaços e tempos. E, acrescento, a escrita deste conto surpreendeu-me, ao ver a história derivar por caminhos imprevistos, qual montada que toma o freio nos dentes...
Agora que Crime na Capital me não pertence mais, filho emancipado que já não precisa de mim para singrar na vida, desejo-lhe ardentemente muitas leituras e agradeço-lhe o ter-me proporcionado este prémio, tal como agradeço ao Município de Arruda dos Vinhos e ao júri a sua atribuição.