Com ligeiro atraso, aqui vai a prometida história, ouvida ao meu amigo X, e depurada do calão setentrião. Precisa de uns retoques, dar-lhos-ei mais tarde. E há problemas de formatação, culpa do IPad (que fino!) em que estou a escrever. Ainda não percebi bem como funciona.
Zacarias vai à discoteca. Com olho de predador, inspecciona possíveis presas, procura eventuais interesses comuns, espreita fragilidades, fareja carências. Exclui as acompanhadas -- veio para o engate, não para a pancadaria. Tampa após tampa das mais giras, vão-se reduzindo as escolhas. Pela madrugada, só resta uma: trinta e muitos, para o gorducho, para o feio, algum mau gosto no arranjar-se, tristonha – ah, Zacarias está por tudo, atormentado por atrozes dores testiculares, longo é o jejum, esta não lhe pode escapar, é a última oportunidade da noite.
Chega-se, educado, melífluo, copo após copo vai-se encostando, escuta-lhe meigamente os desabafos, nada de pressas, mau-grado os protestos da parte baixa, impaciente com tamanhas delongas. E ela fala pelos cotovelos, derrama lágrimas e conta desgraças sentimentais: "Não sei porque é que te conto estas coisas", "Ora, em mim, podes confiar, faz-te bem desabafar", tudo ouve e nada pede em troca, ansioso embora de que ela se deixe de conversas da treta: "Os homens são todos iguais, querem todos o mesmo e apenas isso." Pudica virgem em local destes? Que espera encontrar aqui, afinal? Um príncipe encantado? Não se dará conta de que não é nenhuma princesa donzela a ver feio sapo em cada pretendente? Dissimula o desagrado, não a contradiz, antes lhe enche o copo e insiste para que beba, finge interesse pelos seus dramas sentimentais: "Não sou, não aceito ser, objecto sexual, passatempo, brinquedo de tempos livres"; está na altura de o namorado se decidir, de lhe propor compromisso firme: "Isto assim não é nem deixa de ser, os anos vão passando, para ele, que é homem, tudo bem, mas para mim assim não serve, ele..."
Ele pretextou, conta, turno no hospital, hospital onde, basta ver as séries de televisão, mais namoriscam do que trabalham, e há a colega dos olhos verdes, nova e gira, a Inês, por quem o safado já reconheceu sentir-se atraído... Por isso aqui está sozinha, justifica-se, a cumprir a ameaça que lhe fez: "Então saio eu, estou farta de passar fins-de-semana encafuada em casa à tua espera!"
Zacarias ouve mais do que fala, encosta-se, aperta-a contra si, outra vez lhe enche o copo, ajuda-a a levá-lo aos lábios e quase a força a beber, embora ele se resguarde -- álcool, mau álcool de discoteca, pode ser fatal no momento da verdade. Desponta a madrugada quando saem, ela arrepia-se com o frio matinal, ele abraça-a protector, apoia-a no seu caminhar cambaleante, a moça deixa-se levar, vagamente dá-se conta de que entraram para o furgão de uma carrinha fechada, e ele, não aguentando mais, deita-a sobre colchão de espuma, para cima dela se atira, é agora, é agora, as mãos precipitadas levantam-lhe a camisola de gola alta, desviam o sutiã e apertam-lhe os peitos, depois descem em busca de intimidades mais íntimas, e ela, já mais lúcida, afasta-lhas, esquiva ao toque as partes pudendas, evita-lhe a boca, e fala, fala, já não as lamúrias infelizes de há pouco, antes remorsos, afinal é do namorado que gosta, e o Zacarias quer lá saber de quem gosta ou deixa de gostar, precisa é que abra as pernas e sem mais demora, ela soergue-se como querendo ir embora… Ah, assim não, não quer perder outra noite, tanto trabalho lhe deu, tanta paciência para lhe escutar as baboseiras, está por tudo, em desespero mete-lhe a coisa na mão, implora: “Vá lá, ao menos, uma punheta”.
Ela começa, sem vontade, sem jeito, mas depressa larga a causa de toda aquela maçada: “Faz tu, que também sabes.”