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domingo, 22 de setembro de 2013

Leitura crítica

Proponho como actividade de domingo uma leitura crítica da descrição do deserto que se segue. Depois, podem confrontar os vossos pareceres com os de Rodrigues Lapa, também transcritos.
"Noite encantadora! O luar banha com os seus raios argentinos o areal desértico e imenso. Tudo brilha e refulge sob a claridade branda e suave da Lua. As estrelas, como milhões de pirilampos, estão disseminadas pela quietude misteriosa do firmamento. E no silêncio sepulcral do deserto, apenas cortado pela brisa rumorejante e dolente dos oásis, tudo parece contemplar o céu, meditando no enigma do infinito. Algumas poucas árvores frondosas erguem as copas altaneiras, como que orando a Deus pela solidão atroz que as envolve. Naquela noite alguém lhes faz companhia. É uma caravana. As tendas espalham-se pelo oásis, sob a abóbada das ramagens. Tudo parece dormir. Somente a Lua é cada vez mais brilhante e mais bela, fazendo da areia do deserto um manto branco de virgem a perder de vista nos horizontes longínquos".
"Tudo neste texto soa a falso — a falsidade das coisas que não são vistas nem sentidas directamente por nós.  Os clichés são em número infinito, como as areias daquele deserto postiço: noite encantadora — o luar banha — raios argentinos — areal imenso — claridade branda da Lua — silêncio sepulcral — brisa rumorejante — contemplar o céu — meditar no enigma do infinito — árvores frondosas a erguer as copas — solidão atroz que as envolve — manto branco de virgem — horizontes longínquos.
Uma série de locuções estafadas, de imagens corriqueiras, que, por isso mesmo, nos não produzem a menor impressão artística. A gente sorri-se do inexperiente autor, que procurou fazer estilo, seguindo precisamente o caminho contrário: não nos pôde dar os resultados da sua própria experiência, por não tê-la, e reproduziu apenas o que anda na boca ou nos bicos da pena de toda a gente. O efeito foi desastroso."
M. Rodrigues Lapa. (1984). Estilística da Língua Portuguesa, 11ª ed., Coimbra Editora, Lda., pp. 90-91

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