Aquilo a que já quis é tão mudado,
Que quase é outra cousa, porque os dias
Têm o primeiro gosto já danado.
Camões
Quarenta e muitos anos atrás o meu avô paterno confidenciou-me que queria morrer. Porque, perguntava-me e eu não respondia, o que é que cá andava a fazer. Talvez por isto, tenho sempre defendido que devemos cultivar interesses e ocupações que possamos manter em idade mais avançada. E agora que a minha mãe está finalmente num lar choca-me vê-la, desinteressada, apática, como tantos outros à espera de que os dias passem por eles, sem uma alegria visível, sem um sonho, um desejo. Sem vontade, sem a vontade de viver, o que não significa terem vontade de morrer. E dou por mim a pensar como também prazeres anteriores têm já o gosto danado: deixei de ler religiosamente ao sábado o Expresso e há muito que não sinto interesse pela leitura dos outros jornais; de há uns meses para cá a leitura dos blogues tem sido menos intensa, menos atenta, mais aleatória até; depois de A amante holandesa, não comecei nenhum dos muitos romances que esperam por leitura... Estarei eu a ficar desinteressado como os velhotes do lar, o mesmo vazio no olhar, idêntico ar parado, semelhante conversa resmungona? É sabido que quem lida com um coxo acaba por coxear, pelo que prestei atenção às minhas ocupações e leituras. Ora o que verifico é que cada vez leio mais: neste momento, The Elegant Universe: Superstrings, Hidden Dimensions..., Fernão Lopes (Crónica de D. Pedro e re-re-leituras da de D: João I), João de Barros (Gramática da Língua Portuguesa, Ropica Pnefma -- culpa de Mário de Carvalho, que a refere num dos seus romances --, José Mattoso (Naquele Tempo), e tantos outros. O que se está a passar comigo é, suponho, uma crise de impaciência face à superficialidade de alguns textos e, sobretudo, de temáticas da actualidade.
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