Número total de visualizações de páginas

quarta-feira, 30 de novembro de 2011

C de catástrofe

Enquanto os nossos deputados se divertem em jogos florais, disputando uns minutos de glória nos espaços noticiosos, a esgrimirem argumentos, a fabricarem ironias, a esfalfarem-se em jogos de palavras, tudo oco, descabido, aberrante, o país afunda-se inexoravelmente, a UE caminha num galopezinho muito seguro para o seu fim:
Tivéssemos nós deputados da nação dignos desse nome, governantes à altura da gravidade da situação (mas, reconheço, não os merecemos), e deixar-se-iam uns e outros de folclores e tretas para mercado ver --- estariam todos, neste momento, a trabalhar arduamente num Plano C para Portugal, que nada tem a ver já com direitos adquiridos, cortes, fim de feriados ou aumento do horário de trabalho, mas com a sobrevivência nacional e individual, ambas por um fio.

terça-feira, 29 de novembro de 2011

O pretérito do futuro

Na cidade não havia trigo pera vender, e, se o havia, era mui pouco e tão caro, que as pobres gentes não podiam chegar a elo; (...) e começaram de comer pão de bagaço de azeitona, e dos queijos das malvas e raízes das ervas e doutras desacostumadas cousas, pouco amigas da natureza; e tais hi havia que se mantinham em alféloa.
No lugar hu costumavam vender o trigo, andavam homens e moços esgaravatando a terra, e se achavam alguns grãos de trigo, metiam-nos na boca, sem tendo outro mantimento. Outros se fartavam de ervas e bebiam tanta água, que achavam mortos homens e cachopos jazer inchados nas praças e em outros lugares.
Das carnes isso mesmo havia em ela grande míngua.(...) E começaram a comer a carne das bestas; e não somente os pobres e minguados, mas grandes pessoas da cidade, lazerando não sabiam que fazer, e os gestos mudados com fame, bem mostravam seus encobertos padecimentos. (...)
Desfalecia o leite àquelas que tinham crianças a seus peitos per míngua de mantimento; e vendo lazerar seus filhos, a que acorrer não podiam, choravam amiúde sobre eles a morte, ante que a morte os privasse da vida. (...)
Toda a cidade era dada a nojo, cheia de mesquinhas querelas, sem nenhum prazer que hi houvesse: uns com gram míngua do que padeciam, outros havendo dó dos atribulados. E isto não sem razão, ca se é triste e mesquinho o coração cuidoso nas cousas contrairas que lhe avir podem, vede que fariam aqueles que as continuadamente tão presentes tinham! (...)
Como não quereis que maldissessem sa vida e desejassem morrer alguns homens e mulheres, que tanta diferença há de ouvir estas cousas àqueles que as então passaram, como há da vida à morte? (...).
Pera que é dizer mais de tais falecimentos? (...)
Oh, geração que depois veio, povo bem-aventurado que não soube parte de tantos males nem foi quinhoeiro de tais padecimentos! (...)
Fernão Lopes, Crónica de D. João I

sábado, 26 de novembro de 2011

Treino de instrutores e avançados

Hoje, nos Cardosos, Leiria, dirigido por Vilaça Pinto, sensei. O aspecto enevoado da foto tem uma explicação: a lente embaciada.

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

25 de Novembro de 1975

Eu estive . Tinha 21 anos e vivi-o por dentro, com muito medo, completo desnorte -- afinal, de que lado estava eu? Como se furriel miliciano tivesse direito a tomar partido! Um dia, escreverei sobre a forma como vivi esse dia e, pior, os seguintes, a comandar soldados em barricadas, os oficiais confortavelmente  resguardados no quartel, as carreiras protegidas qualquer que fosse o lado vencedor. No rescaldo do golpe, eu fui saneado, eles ficaram, vitoriosos como sempre, apesar de ter ganho o outro lado.
FOTO: tirada pouco tempo antes. O primeiro mancebo de joelhos à direita -- era eu.

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Amanhã, 24/11, é dia de

Feriado Municipal no Entroncamento.

terça-feira, 22 de novembro de 2011

Da sabedoria

"Examinei, então, aquele homem a fundo. Não é preciso dizer o nome dele, mas era um dos nossos homens de Estado, o qual, no exame que fiz, me deu a impressão que vou contar-vos. Conversando com ele, pareceu-me efectivamente que aquele homem parecia ser sábio aos olhos de muita gente e sobretudo aos dele próprio, mas que o não era de modo nenhum. Procurei, então, provar-lhe que ele não tinha a sabedoria que julgava possuir. Com isto só consegui, dele e de vários assistentes, obter inimigos. Enquanto me ia embora, fui dizendo para comigo: «Afinal, sou mais sábio do que este homem. E possível que nem eu nem ele saibamos algo de belo ou de bom. Mas ele julga saber alguma coisa, quando não sabe nada; ao passo que eu, se não sei nada, também não creio que o saiba.« Depois desse tal fui procurar um outro, um daqueles que passavam por ser ainda mais sábios que o primeiro. A minha impressão foi a mesma e mais uma vez recolhi inimigos, da parte dele e de muita outra gente."
Platão, Diálogos, "Apologia de Sócrates"

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Serviço público

Uma equipa da RTP acompanhou durante uma semana o foragido americano que cá se escondeu da justiça do seu país. Ficaremos certamente a saber se mija de pé ou sentado, quantas vezes o faz por dia, se fala muito ao telemóvel, e qual  o seu prato favorito. Se tempo houver, também o que pensa da administração Obama, da crise na Europa e do nosso futebol. 
São tipos como este e as suas aventuras e desventuras que devem preencher o espaço televisivo, roubando protagonismo e notoriedade a Duarte Lima e aos gajos da Face Oculta.
Porque dantes só uma má notícia era notícia; hoje, para isso, é preciso também emergir do lixo.

Diz o roto para o nu

domingo, 20 de novembro de 2011

Outra cabaça ao vento

Já ouviram o discurso de Mariano Rajoy? Nem uma ideia, nem uma estratégia, Pobre España! Se mal estavas, pior ficas. Não faltará muito para que também tu sejas governada pela Troika ou pelos seus mandantes!
Enfim, como no futebol, o que conta é ganhar e festejar; amanhã, passada a euforia da vitória, dar-se-ão conta de que não há bebedeira que compense a ressaca matinal.

Uma cabaça ao vento*

Assunção Esteves, em entrevista ao Público expõe brilhantemente medidas simples de salvação da pátria, da Europa -- quiçá da humanidade::
“Um novo paradigma para o capitalismo passa por um regresso da política. Eu acredito que numa folha A4 se podia mudar a Europa toda”, 

“É uma questão de acertar em cheio. Esta crise já nos obrigou a ver as evidências, agora falta só a coragem de as passar ao papel.” Qual seria a primeira frase? “É preciso criar coerência nas políticas de acordo com os valores fundamentais que já existem. Isto é fazer ligar a decisão à proclamação. Nós proclamámos valores unos, mas não temos políticas unas.”
Assunção Esteves revela ainda que foi convidada pela Maçonaria e pela Opus Dei: “Não fui para nenhuma”. E fala da Europa, do Parlamento (que “é um lugar de ruído”, “não uma igreja”) e do futuro. 
Como se vê, não faltam à senhora ideias. Tantas e tão boas  que foi convidada pela Maçonaria e pela Opus Dei, logo pelas duas! Pena que não tivesse aceitado entrar -- para as duas! E consta que trabalha de graça, recebendo apenas de reforma 7 mil euros. Injusto, cruel, este desprezo de Portugal pelos seus maiores: também dela se pode dizer: "Este país te mata lentamente"!
* Título roubado de Ran, Os Senhores da Guerra, de A. Kurosawa. Quando o bobo canta: "Olhai o senhor / Uma cabaça ao vento / Vai por aqui... / Vai por ali..."

sábado, 19 de novembro de 2011

O fogo prende os heróis

Grande título que o Afonso deu a este desenho que fez  em co-autoria com o Miguel. Género abstracto, traço decidido, cromatismo interessante. Mais não posso dizer, que também de pintura nada percebo, excepto o "gosto" ou "não gosto".

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Confusos?

Bom, eu estou. E basta ler alguns dos títulos  do dia para ver que os especialistas também andam perdidos:

Ulrich critica troika e elogia Governo 

Carlos Tavares alerta para perigo de nova crise financeira 

Ainda os especialistas

O cidadão tem o direito de votar, mas não parece ter o de se pronunciar sobre a governação, uma vez que não é especialista nas suas diversas áreas. Se escreve, como eu faço neste blogue, reconhecendo humildemente que não sou autoridade na matéria, mas exercendo o meu direito de ter opinião e de a divulgar, eis que me tentam rebaixar, forçar ao silêncio, coisa de "planta batatas e cala-te." Como se os disparates fossem privilégio exclusivo daqueles que nos meteram no lodaçal em que nos encontramos, dos seus amigos, comparsas e apaniguados.
Desiludam-se: não peço a ninguém que me leia; não peço a ninguém licença para escrever, nem o faço para agradar a pessoas ou a partidos; apesar das minhas contradições, erros e, assumo-o, ignorância, escrevo seguindo os ditames da minha consciência, não em busca de favores, de promoção social, mas apenas porque quero. E imodestamente faço meus estes versos de Camões:
Mas eu que falo, humilde, baxo e rudo,
De vós não conhecido nem sonhado?
Da boca dos pequenos sei, contudo,
Que o louvor sai às vezes acabado.
Não me falta na vida honesto estudo,
Com longa experiência misturado,

Os especialistas

Com uma fé irracional como o são todas as fés, a humanidade delegou nos entendidos o seu destino -- e o resultado está à vista: a Europa, o Mundo, enfrentam uma crise como não conhecemos outra em tempo de paz. O mais caricato é que num tempo de desorientação, em que verdadeiramente ninguém sabe o que fazer nem qual a solução, se chamam os fautores da desgraça para nos devolver a prosperidade de outrora, como na Grécia e na Itália, agora governadas por homens anteriormente ligados à Goldman Sachs; na vizinha Espanha, o presumível vencedor não parece saber o que fará eleições ganhas; Obama palra; a China acumula desaires da Líbia aos vizinhos do Sul, num desnorte confrangedor; o Japão, incapaz de se refazer da catástrofe nuclear, anda apagado... 
Há, porém, vozes dissonantes, que deveriam ser escutadas porque têm do seu lado a experiência, acumularam resultados positivos, aprenderam com os fracassos; mas na nossa arrogância, desprezamo-los porque são velhos, porque são da maldita esquerda, porque não são especialistas em Economia, em Gestão, não trabalharam nas financeiras responsáveis pela crise, não propõem como única saída cortes e a destruição do modo de vida ocidental, o qual, com a suas imperfeições e talvez inviabilidade económica, é seguramente bem melhor para os desvalidos, os enfermos, os pobres do que a alternativa que se esboça: saúde, educação, pão para quem puder pagar.
Dentre esses homens, uma raposa velha: Mário Soares, que hoje afirmou, entre outras coisas, isto:
“Os europeus vão ser obrigados a meter as agências de rating na ordem e a acabarem com a ladroagem dos paraísos fiscais”
Receio que tal vá demorar. Porque os especialistas que são chamados à governação, cá e lá fora, aprenderam pela mesma cartilha económica e onde Soares vê ladroagem eles vêem as virtudes e as potencialidades do sistema financeiro. E nós, iludidos pela crença nos especialistas nisto e naquilo, depositamos a nossa esperança, os nossos salários, o nosso futuro, precisamente em quem nos corta a esperança, os salários e, receio, o futuro.
Nota: não me interessam os disparates maniqueístas que opõem esquerda e direita. Em termos de partidos, a merda é a mesma. O que não significa que pretenda governação tecnocrática, à italiana ou à grega.

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Trapalhadas, vulgo filha-de-putices

Como é que se dizia? "Roma não paga aos assassinos dos seus generais"? (Confesso que nunca percebi de quem eram os "seus generais", se dos assassinos, se dos romanos.) Bom, o que importa é que os governantes um dia deixarão de o ser e alguns, que não precisaram da política para fazer carreira, vão ter de viver com aquilo que entretanto fizeram e de conviver com aqueles que, justificada ou injustificadamente, tramaram. 
Raio, pareço o presidente da República com estas confusões sibilinas. Vamos lá, portanto, a ser mais claro.
Nada percebo de teatro, nem de gestão, nunca entrei no D. Maria e não faço a mínima ideia da qualidade do trabalho do Diogo Infante. Mas Francisco José Viegas, escritor que admiro, está a meter-se numa camisa de onze varas. Quase como Saramago, com os seus saneamentos -- mas Saramago, então, não era escritor, nem ninguém pensava que o viesse a ser. 
Compreendo que Francisco José Viegas não tenha dinheiro na sua secretaria de estado. Não compreendo é o que lá está a fazer. Qualquer contabilista, qualquer merceeiro, pode, nas actuais condições, ser secretário de estado da Cultura. Ou ministro da Educação. E pessoas decentes não precisam de se ver metidas nestas alhadas.

Bandidos e foragidos

Leio no Correio da Manhã que um recluso se evadiu. Passo do título à notícia, esperando fuga rocambolesca, digna do Papillon ou, pelo menos, envolvendo lima no bolo de aniversário. Desilusão. Já nem os foragidos são como os de antigamente. O bandido fugiu durante uma saída precária.  E eu a querê-lo a transpirar serrando grades pela calada da noite, ou cavando túnel sob os muros da prisão, ou lançando-se num mar infestado de tubarões em jangada de cocos... 
Enfim, bandidos a sério já só na literatura.

terça-feira, 15 de novembro de 2011

Pensamento do dia

"Nunca tantos foram roubados por tão poucos".  Nada original, reconheço. Mas, infelizmente, verdadeiro.

Epígrafe para a arte de furtar

A coima

Surpreendeu-me e indignou-me carta da finanças a exigir-me 15 euros de coimas relativas a atrasos no pagamento do selo do carro, em 2008. Paguei então o selo pela internet, bem eu sei agora, três anos depois,  se foi dentro ou fora do prazo. O que sei é que paguei e o pagamento foi aceite, pelo que supunha o assunto encerrado -- até porque esse carro foi para abate em 2010, na sequência de um acidente aqui relatado. Leio hoje no Sapo que
O Fisco notificou 472 mil contribuintes por pagamentos do Imposto Único de Circulação (IUC), antigo selo do carro, feitos fora do prazo. Estes contribuintes terão agora de pagar a respetiva multa, no valor de 15 euros.
Fiz contas. Dá  7.080.000 euros. Cobrados num ápice, sem esforço nenhum. Alguém nas Finanças merece um prémio de produtividade. E de criatividade.

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Delícias de outrora

Aos meus netos, mais do que as tolices promovidas pelo Plano Nacional de Leitura, gosto de lhes "ler" os livros da escola primária do meu tempo. Esta página, do Livro da Primeira Classe, é das que mais apreciam: tem animais variados, acção, suscita interrogações (porque é que a velhota os enxota com a vassoura?), permite aos mais novos recordar as vozes dos animais (como é que faz o peru? e o pato?), ao Afonso a leitura das palavras que já conhece... E é ver como interrompem as brigas constantes para se sentarem os três (por enquanto!) à minha volta a tentar compreender uma realidade tão diferente da deles.

A galena

Bem antes da internet, da televisão a cores, da sua antepassada a preto e branco, até dos aparelhos de rádio de válvulas --- existiu a galena, rudimentar aparelho de TSF, sigla hoje anacrónica para Telefonia sem Fios. Não usava electricidade, podia ser construída por amadores -- eu nunca fui capaz de fazer nenhuma, mas faltava-me, para além da habilidade, o ingrediente básico, sulfureto de chumbo, vulgarmente chamado galena -- e permitia ouvir à distância o romance radiofónico, os cantores da moda, os noticiários.
Hoje, com tantos canais de televisão e de rádio à nossa disposição, a dificuldade estará sobretudo na selecção, problema que já então  tínhamos, podendo escolher entre a Emissora Nacional e o Rádio Clube. Havia também muito ruído de fundo, da estática, que entretanto, culpa do progresso, se tornou algazarra.

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Uma fúria grande e sonorosa

Tudo começou uns dez anos atrás, creio que no Átrio Saldanha, em dia de chuva como o de hoje. Uma menina dava cartões de crédito. Tentei escusar-me: não uso, não preciso, não quero. Mas nunca usou? Sim, apenas para compras via internet, uns livros da Amazon... E quanto paga pelo seu cartão? Bom, eu tinha de fazer tempo, dei conversa, acabei com um cartão de crédito "gratuito". Que entretanto caducou. Se porventura me enviaram substituto, não sei. O que sei é que nunca o activei nem utilizei. Não tenho, portanto, nenhum cartão de crédito desse banco..
Pois hoje, tomava banho nos balneários do ginásio após o meu treino individual, e toca o telemóvel. Número desconhecido. Senhor José Catarino, como está, tem passado bem? Era de um banco estrangeiro. Resmungo: importa-se de se despachar? Estou nu, molhado, tenho mais que fazer. É má ocasião para falar de negócios, pode ligar-me mais tarde? Não podia ser. E, finalmente, desembucha: como não paguei os dezassete (17) cêntimos da anuidade, tenho uma conta de trinta e cinco euros e quarenta e cinco cêntimos em dívida...
Tenho mau feitio. Só não mandei a menina apanhar bolota.
Previnem-me: tens toda a razão, não imaginas quantas pessoas foram já vítimas desse conto do vigário, mas se não pagas ficas com o nome na lista vermelha do Banco de Portugal. E, entretanto, a dívida vai aumentando vertiginosamente. 
Preso pelos tomates, paguei dívida que não reconheço (35,45). Dentro de momentos (porque é preciso pagar primeiro para poder anular) vou cancelar todo e qualquer negócio, real ou virtual, presente ou futuro com esse "banco". Comem-me por parvo, mas não me comerão mais por parvo. Da primeira, ninguém se livra. Na segunda, só cai quem quer.

terça-feira, 8 de novembro de 2011

Os extraterrestres, de novo

O meu cepticismo relativo a discos voadores e alienígenas não é devido a desinteresse pelas descobertas, teorias e hipóteses que a ciência coloca sobre o Universo. Por exemplo, depois de ter lido nas últimas férias The Elegant Universe: Superstrings, Hidden Dimensions, and the Quest for the Ultimate Theory, de Brian Green, mandei vir e li The Fabric of the Cosmos: Space, Time, and the Texture of Reality  e, ontem, The Hidden Reality: Parallel Universes and the Deep Laws of the Cosmos, ambos do mesmo autor. Ah, e leio-os em Inglês não por facilidade ou por snobismo, mas porque os dois últimos não estão traduzidos para Português e como tenho um Kindle...

Os extraterrestres, o Tai Chi Chuan e eu

Anos atrás, seguia com aplicação e entusiasmo um seminário de Tai Chi, dinamizado pelo mestre Yang Jewing-Ming. A filosofia, a prática... estava a adorar. Mas numa das sessões teóricas deu-lhe para dissertar sobre discos voadores, extraterrestres que raptavam mulheres para as inseminar e tretas do género. Boa parte da assistência adorou, não faltaram questões, hipóteses, testemunhos, certezas; muitos pareceram-me até mais interessados nestas conversas sobre o esotérico do que na prática física do Tai Chi. Quando a sessão terminou, saí e não voltei mais. Acabou ali.

Os extraterrestres

Cansado de tanta patranha pseudo-científica, deixei a televisão que, no Canal História, palrava sobre ETs, deuses gregos e quejandos. Não que me repugne a investigação de assuntos como este, que, a serem verdadeiros, seriam da máxima importância para a humanidade: sabermos que não estamos sós faria certamente com que olhássemos para os nossos problemas, para o Mundo, para o Universo, com outros olhos. Não, o que me aborrece é a substituição do método científico, nomeadamente da refutação de dados e "provas", por fé: "eu acredito que..." Ora aquilo em que cada um acredita não é da minha conta; o que me interessa é aquilo que pode submeter e resistir a análise imparcial ou mesmo hostil, como sucede em ciência, em que há geralmente mais investigadores a tentar destruir hipóteses, teorias e evidências do que a sustentá-las.
Por coincidência, pouco depois leio no Público Online a resposta oficial da Casa Branca às questões sobre extraterrestres:
“O Governo não tem provas da existência de qualquer forma de vida fora do planeta, ou de uma presença extraterrestre ter contactado ou se ter relacionado com a raça humana”, diz o texto, que continua explicando que quer o célebre E.T. seja “um homenzinho verde ou uma bactéria, não há informação credível que sugira que qualquer tipo de prova está a ser escondida da opinião pública”. 
Este comunicado não fará desistir, nem sequer abrandar, os maníacos dos ETs -- até porque muitos vivem dessa mistificação e jamais quererão abandonar a galinha dos ovos de ouro. A mim, tranquiliza-me: não sou o único a recusar tomar a nuvem por Juno.

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Aparas

Fragmentos que estão a mais. Não são gorduras nem excrescências. Mas não pertencem à história em que surgiram e por isso são aparados. Ou podados.

"2. In illo tempore
Começa a nossa narrativa já não naquele tempo em que Jesus andava pelo Mundo, mas noutro igualmente saudoso, em que a missa era ainda em Latim para gáudio da miudagem que, ao fundo da igreja, o mais afastada possível de beatas, pouco compreendendo e menos ainda querendo entender, adulterava as respostas, mantendo a música: se, do alto do altar, o padre abria os braços e lançava cantado Dominus vobiscum, haveria malandro que substituiria o Contigo também entoado em coro por Merda pra ti também, com ar tão inocente que se, acaso, olhares indignados se viravam para trás era por causa da risota e não do dito... Orate frates, dizia o vigário e o povo respondia em vernáculo Oremos, enquanto ajoelhava no cimento da capela — mas o que se ouvia, se estivéssemos perto e atentos, era moço sussurrar, ao baixar-se como faria em vinha para arrear o calhau: Caguemos!
Pregado no crucifixo, Jesus refulgia quando a passagem da sotaina do padre espevitava as velas, como se também ele animasse com os disparates da mocidade naquele ritual chato e repetitivo e então eu pensava que se Ele saísse da cruz onde o aprisionaram para todo o sempre, também Ele quereria escafeder-se do cheiro a cera e a incenso, sem mágoa abandonaria beatas e templo mal iluminado e, atraído pelo Sol que penetrava pelos vitrais, voaria aliviado para o adro, sem esperar pelo final daquele santo suplício semanal que torturava a nossa juventude e O castigava há quase dois milénios...
Corria assim a vida, lenta, chata, sonhando com os vinte anos, distantes, tão distantes como a eternidade — então eu deixaria a aldeia, embarcaria, correria mundo sofrendo tempestades, evitando icebergues, sim, conhecia já a palavra, que já lera e relera Pedro, Pescador de Baleias, e também eu as caçaria, ou enfrentaria os piratas na Ilha do Tesouro, ou então chamar-me-ia Zé Crusoé e sobreviveria com arte e manha, sozinho numa ilha deserta do Pacífico...
O Sr. Prior prosseguia com o ritual e eu alheava-me novamente, e conversava agora com o próprio Jesus, persuadindo-O a deixar-me ajudá-lO a endireitar o Mundo, que tão mal andava; já então a Morte, como fim de tudo, me apavorava, sem que, por isso, me convencesse a retórica do padre apregoando o Céu, assustando com os padecimentos infinitos do Inferno. Não, aquele Céu de devoção beata, água benta e hóstias desenxabidas, tresandando a cera e a incenso, feito à imagem e semelhança de uma qualquer capela mal iluminada, onde o prazer adviria exclusivamente da eterna adoração a Deus, não me convencia, como me não seduzia viver a Eternidade na companhia dos velhos e velhas que assistiam ao Santo Sacrifício dominical.
Sobrevivíamos; hoje, meio século depois, creio que éramos felizes; naquele tempo, a palavra não tinha significado. Sabíamos o que era doença e saúde, fartura e miséria, frio e calor, mas felicidade não pertencia ao nosso vocabulário. Sonho, sim; eu devaneava acordado o tempo todo..."
(Original meu)

Detesto ter razão

Em breve, a Alemanha, a França e demais ricos também estenderão a mão à caridade dos especuladores... Prevejo também greves, revoluções e conflitos étnicos e religiosos na China...
Mudem de rumo. Enquanto é tempo. Porque, já todos deveriam ter percebido, o problema não é a Grécia, Portugal ou a Irlanda. É a desordem financeira mundial -- nenhum país está, nem ficará, imune, do Brasil à Rússia, de Angola aos EUA. É preciso por freio duro na cobiça, já dizia Camões:
E ponde na cobiça um freio duro,
E na ambição também, que indignamente
Tomais mil vezes, e no torpe e escuro
Vício da tirania infame e urgente;
Porque essas honras vãs, esse ouro puro
Verdadeiro valor não dão à gente:
Melhor é, merecê-los sem os ter,
Que possuí-los sem os merecer.

domingo, 6 de novembro de 2011

A próxima semana

Informação do Syngenta:

Os trafulhas

Há por aí uma ideia generalizada: os gregos, mas não os alemães, são uns trafulhas. Numa só ilha grega, há 700 espertalhões de olhos bem abertos a receber pensão por cegueira. Vamos, portanto, bater nos gregos, que é o que está a dar. Livrem-se, porém,  de tocar nos alemães, ou serão suspeitos de germanofobia.
Vamos por partes. 
(1) Cegos que vêem merecem pensão: está visto e provado que os políticos e economistas do nosso tempo não vêem nada do que se passa -- ou, como os cegos gregos, só vêem o que lhes convém -- e, no entanto, ninguém lhes cortou ainda pensões e salários.
(2) Tenho memória. E lembro-me de não há muito tempo ter lido uma reportagem sobre cidadãos alemães que apresentavam atestados médicos declarando que eram alérgicos à pátria, pelo que a segurança social lhes pagava para viverem onde melhor se sentiam. Um deles vivia na Califórnia. Tinha exigido e conseguido uma pensão muito alta para poder manter nível de vida adequado e digno.
(3) Casos como estes foram agora esquecidos. Até parece que todos os trafulhas foram deslocalizados para os países do sul da Europa.

Esperanças

sábado, 5 de novembro de 2011

Ténue sinal de esperança

Digo e repito: não há esperança no actual estado de coisas. Por isso me agradou ouvir ontem Sarkozy prometer combate sem tréguas aos paraísos fiscais. Não é ainda a solução; mas pode ser um bom princípio, isto se se passar das palavras aos actos.

L'illusion comique


Parece que as leis da física são independentes da seta do tempo e nenhuma delas justifica a nossa crença de que tudo – o Universo, nós – evolui de um passado para um futuro. Como se o Tempo fosse uno, total, e um projector, talvez a nossa consciência, iluminasse fragmentos desse tempo numa ordem que corresponde à nossa sensação da passagem do tempo.
Ideia completamente avessa às nossas convicções mais profundamente enraizadas, àquilo que julgamos serem as nossas observações quotidianas; mas ideia consistente com as leis da física, com as evidências empíricas, que parece casar com outra ideia abstrusa, mas também ela suportada por evidências: a holográfica:
Maybe, that is, the universe’s real physical processes take place on a thin, distant surface that surrounds us, and all we see and experience is merely a projection of those processes. Maybe, that is, the universe is rather like a hologram.


Corneille teria adorado este jogo de ilusões, cada uma escondendo outra e todas elas mascarando a realidade -- se é que tal coisa existe.

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Karaté de velhos

Treino sozinho pelo menos três vezes por semana. E às quartas, no âmbito do Desporto Escolar, ensino os rudimentos do Karaté a alguns miúdos -- etiqueta, kihon e kumité básicos, as três primeiras Heian. Nos meus treinos solitários, aqueles que verdadeiramente me interessam, começo com Qi Qong, a que chamamos modestamente aquecimento, prossigo com o kihon do meu programa de exame e um pouco do das graduações inferiores, estudo kumité em frente do espelho na falta de parceiros, aplico-me nas partes mais difíceis das katas, executando-as lentamente e corrigindo-as graças aos espelhos, depois passo a repetições sucessivas da tokui-gata procurando a correcção de posições e de movimentos, o ritmo, a sensação, o equilíbrio, a velocidade e a força, desenjoo com Bassai Dai e com Empi, a kata antagónica, faço revisões de Jion, acrescento abdominais e flexões, termino com Qi Qong, agora chamado arrefecimento -- e banho.
Neste momento, e seguindo sugestão do meu mestre, a minha tokui-gata é Ji'in, kata que não apreciava. Porém, e à medida que a vou repetindo e tentando aperfeiçoar, começa a fazer mais sentido --  e não é que já gosto dela?
Karaté de velhos, troçarão os moços, amantes de competições, taças, glória. Sim, sem dúvida. Quem me dera poder continuá-lo por muitos anos. Porque a paixão não esmorece e, finalmente, sinto que estou a fazer progressos na Arte da Mão Vazia.
FOTO: o salto a 360 graus de Empi, "a andorinha em voo"

O Tempo

Extraído de  The Fabric of Cosmos: Space, Time, and the Texture of Reality:

Past, present, and future certainly appear to be distinct entities. But, as Einstein once said, “For we convinced physicists, the distinction between past, present, and future is only an illusion, however persistent.” The only thing that’s real is the whole of spacetime.

quinta-feira, 3 de novembro de 2011

A cegueira e o inevitável

Estrebucham os comentadores quais enguias na frigideira -- imagem que me é cara --, culpando a Grécia dos males da actualidade, incapazes de ver, porque o pior cego é aquele que não quer ver, que o problema não reside na Grécia nem nos gregos, mas num modelo social absurdo, que colapsará inevitavelmente, independentemente dos nossos desejos. Já aqui o escrevi: a riqueza é, na sua maior parte, virtual, o que explica que os bancos tenham perdido de um dia para o outro boa parte dos seus "activos". A riqueza actual é, sobretudo, especulação e foi "produzida" vendendo sucessivamente o mesmo bem quase sempre com ganhos, pelo que o seu valor se multiplicou astronomicamente -- e tudo o que sobe tem de descer, diz-se, como se diz também que quanto mais alto se sobe maior é é o trambolhão.
Se tivéssemos políticos capazes de olhar para o futuro em vez de fitarem tristemente a biqueira dos sapatos, estaríamos a implementar activamente um aumento da produção de bens agrícolas e industriais, sobretudo de primeira necessidade, a reinvestir nas pescas e nos recursos marítimos, nomeadamente na aquacultura. Colocaríamos sérios entraves à concorrência desleal, contrariando a entrada de bens concorrentes a custo inferior, invocando razões sanitárias, ecológicas, o que quer que fosse, contanto que desse tempo para apodrecerem antes de serem cá comercializados, arruinando ainda mais quem insiste em produzir.
Se, como receio, a bancarrota -- a grega, a nossa, a europeia -- for inevitável, teríamos ao menos com que matar a fome e assegurar as necessidades básicas da população. Se não for -- e bem gostaria que não fosse -- poderíamos fazer a eventuais excessos na produção alimentar o mesmo que o ministério da saúde está a fazer às vacinas da gripe.

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Parabéns!

A esta bebé, hoje femme de trente ans.

O tempo

Que é, afinal, o Tempo? À semelhança das três dimensões espaciais que conhecemos, é simétrico ou evolui num único sentido? A leitura de The Fabric of Cosmos: Space, Time and the Texture of Reality não me deixou esclarecido, antes me suscitou ainda mais questões relativas às duas entidades básicas da realidade: o espaço e o tempo. Leitura fascinante, difícil, por ser em Inglês e, sobretudo, pelos conceitos que envolve. Dela aqui darei conta reproduzindo excertos, num esforço (certamente vão) para eu próprio tentar entender quem somos, de onde vimos, para onde vamos.
No one has as yet found the definitive, fundamental definition of time, but, undoubtedly, part of time’s role in the makeup of the cosmos is that it is the bookkeeper of change. We recognize that time has elapsed by noticing that things now are different from how they were then. The hour hand on your watch points to a different number, the sun is in a different position in the sky, the pages in your unbound copy of War and Peace are more disordered, the carbon dioxide gas that rushed from your bottle of Coke is more spread out—all this makes plain that things have changed, and time is what...

Termópilas

Cansado de estrugir na frigideira para gáudio dos conservadores europeus -- os mesmos que aceitaram alegremente as patranhas do governo anterior para que não perdesse as eleições -- o primeiro ministro grego fez a Grécia saltar para o lume vivo, levando consigo os castigadores implacáveis, acirrados pela demagogia da populaça iluminada pelos tablóides.
Irão todos -- iremos todos -- arder na mesma fogueira, a não ser que os nossos governantes nos prefiram continuar a frigir no azeite fervente da especulação, sem coragem para lhe pôr o freio que se impõe. 
Este grego, que eu tanto tenho desprezado, revelou-se, afinal, digno dos egrégios avós.
ADENDA: outro político que bem me enganou. Mais uma vez, nada mais que "de la merde dans un bas de soie", como Napoleão descreveu Talleirand.

terça-feira, 1 de novembro de 2011

Leitura recomendada

Paulo Morais, O essencial sobre o problema do país. No Delito de Opinião (publicado por António Manuel Venda)  e no Correio da Manhã.