Alguém disse ao velho que a sua jovem mulher andava metida com outro – o seu melhor amigo. E ele, rancoroso, calou-se bem calado. A vida dos três continuou a decorrer pacatamente na normalidade aldeã até que, num belo dia (convém que o tempo não seja elemento de perturbação na história) pediu ao amigo, pedreiro: -- Havias de me ir ver o telhado, que mete água quando chove, isto também porque só se sobe ao telhado em belos dias, para não partir as telhas, para não escorregar e cair.
E o pedreiro foi. Então o amigo deu-lhe um tiro e o amigo caiu redondo no chão, já morto. No julgamento todos testemunharam que eram amigos, nunca entre eles houvera disputas, nunca se disseram palavras azedas. Tão amigos que o defunto até tinha jantado em sua casa na véspera e almoçaria nela se não tivesse morrido por acidente, quando a caçadeira que limpava se disparou por acaso. Não sei se os juízes percebem de armas, nem por que lhe não perguntaram como se limpa arma carregada, por que se limpa a arma com o cano apontado para o telhado, exactamente para o amigo que substituía telhas partidas. Foi absolvido. Todos sabiam que fora ajuste de contas por conta do par de cornos, mas a vida nas aldeias é assim, comenta-se e nunca se diz, menos em tribunal, ninguém quer arrostar com uma carga de trabalhos, nada devolverá a vida ao morto, e ainda acabariam processados por calúnias, difamação, onde obter as provas, se o tribunal, com os meios para as conseguir, se deu por satisfeito com as evidências (como gosto da palavra!) apresentadas?
Ora tempos depois o nosso matador resolveu matar o porco, na via pública, como sempre se fez desde tempos imemoriais. Passa a GNR, processo, coimas: dez contos!
E o nosso homem, descontente com o desconcerto do mundo: -- Matei um homem, não me custou nada. Matei um porco, dez contos de multa!
E o pedreiro foi. Então o amigo deu-lhe um tiro e o amigo caiu redondo no chão, já morto. No julgamento todos testemunharam que eram amigos, nunca entre eles houvera disputas, nunca se disseram palavras azedas. Tão amigos que o defunto até tinha jantado em sua casa na véspera e almoçaria nela se não tivesse morrido por acidente, quando a caçadeira que limpava se disparou por acaso. Não sei se os juízes percebem de armas, nem por que lhe não perguntaram como se limpa arma carregada, por que se limpa a arma com o cano apontado para o telhado, exactamente para o amigo que substituía telhas partidas. Foi absolvido. Todos sabiam que fora ajuste de contas por conta do par de cornos, mas a vida nas aldeias é assim, comenta-se e nunca se diz, menos em tribunal, ninguém quer arrostar com uma carga de trabalhos, nada devolverá a vida ao morto, e ainda acabariam processados por calúnias, difamação, onde obter as provas, se o tribunal, com os meios para as conseguir, se deu por satisfeito com as evidências (como gosto da palavra!) apresentadas?
Ora tempos depois o nosso matador resolveu matar o porco, na via pública, como sempre se fez desde tempos imemoriais. Passa a GNR, processo, coimas: dez contos!
E o nosso homem, descontente com o desconcerto do mundo: -- Matei um homem, não me custou nada. Matei um porco, dez contos de multa!
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