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quarta-feira, 30 de março de 2011

Noite

Farrapos de nuvem devoram o verde
Pisam sem remorsos malmequeres
E um olhar destemido atravessa o tempo
Atravessa-me no meu tempo  – eu sei, não sou daqui
daqui onde a chuva é delícia
e o mau tempo recebido com prazer

Não como a ave que traz à terra o puro branco do céu
e o solta num efémero grito divino
Mas sombra do hoje, que passa e não deixa vestígio
De mim que ficará?
pó sobre pó
vida tão útil ou inútil
como um soluço no tempo
que tudo amassa e aniquila
e só ele sobreviverá

Não, não é isto que me mete medo.

Nem mesmo definhar irremediavelmente
qual candeia antiga a que o azeite vai faltando
e que, em se apagando a sua luz,
tresanda a sebo ardido e nauseabundo

Não, não é o me mete medo.

Só o saber que a matéria que hoje sou
por um breve momento pensou e sem chegar a compreender
logo voltou a ser verme cego e ignorante
farrapo de estrume entre filhos das nuvens
irmão de malmequeres no ódio ao puro branco do céu

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